por Paulo Diniz
(postado na edição de 27/12/2015 de O Tempo - Belo Horizonte, Minas Gerais)
A
definição do STF sobre pontos do rito de impeachment pode ser vista, do ponto
de vista estratégico, como uma vitória do governo. A proibição do voto secreto
no processo de impedimento da presidente, por exemplo, muda muito o panorama na
Câmara dos Deputados: a insatisfação que se acumula há anos nessa Casa,
responsável até pela eleição de Eduardo Cunha para seu comando, terá mais
dificuldade para se expressar. Cada deputado será obrigado a assumir seu
oposicionismo, arriscando sofrer as retaliações de praxe. Esse tipo de medida,
determinada pelo Judiciário, ataca os sintomas mas deixa intactas as causas da
crise política atual: dificultar a atuação dos deputados insatisfeitos não os
torna felizes, apenas os obriga a procurar uma nova maneira de expressar sua
frustração.
Sendo
o PMDB o ponto central da atual conjuntura política, é possível dizer que a
abordagem feita por Dilma em relação a esse partido está em algum lugar entre o
amadorismo e o desrespeito. É fato que o PMDB é dono de um apetite gigantesco por
cargos, mas acreditar que um punhado de nomeações seria suficiente para
apaziguar o partido foi uma leitura superficial da situação. O que o PMDB
deseja, e não recebeu, é a participação efetiva no exercício do poder: foi o
que quis dizer Michel Temer quando disse, em sua carta à presidente, ter sido
relegado a um papel “decorativo”.
Considerando
que na equipe de coordenação política de Dilma Rousseff exista alguém sensível
a ponto de perceber esse contexto, porque então seria tão difícil ao governo
petista compartilhar parte do poder? A partir de falas e atos de lideranças do
PT, é possível conjecturar que o principal obstáculo é a própria concepção de
democracia que predomina nas mentes e instituições petistas. Basicamente, o PT
trata por democracia a simples ideia de maioria nas urnas: a partir dessa, o
“vencedor” teria direito a todo o butim que restou da “batalha” eleitoral.
Essa
noção superficial da democracia, portanto, impede que o governo perceba as
consequências práticas do apertado resultado das urnas de 2014: se Dilma venceu
por uma margem mínima acima da metade dos votos, significa que sua gestão não
foi desejada pela outra metade do eleitorado; qualquer outro observador
esperaria, portanto, forte rejeição ao governo desde o início. Não há como
esperar que os eleitores tucanos esquecessem suas insatisfações e se tornassem,
automaticamente, fieis ao novo governo petista após a apuração das urnas: toda
essa insatisfação, em uma democracia representativa, adentra o sistema político
e alimenta a crise que temos hoje.
Dividir
poder e buscar compor com quem faz oposição são duas ações vitais para a
sobrevivência do governo, mas que até agora sequer foram ensaiadas por Dilma e
sua equipe política. Esses, aliás, se agarram aos números quase cabalísticos
que saíram das urnas, como se a mera existência desses trouxesse cura a todos
os males políticos; ignoram o quão dinâmica é a política, e indiferente aos
frios papeis emanados do Judiciário.