quarta-feira, 26 de agosto de 2015

Frágil equilíbrio

por Paulo Diniz
(publicado na edição de 23/08/2015 de O Tempo - Belo Horizonte, Minas Gerais)

As manifestações realizadas em 16 de agosto foram cheias de significado para as diversas correntes políticas atuais. Para a classe média, que pela terceira vez deixou as panelas para ir às ruas, está ficando claro que não basta expressar sua indignação aos quatro ventos: para concretizar a mudança que desejam, é preciso uma tática concreta, assim como atores do sistema político dispostos a assumir tal empreitada. Por isso, foi possível perceber a predominância dos pedidos de impeachment de Dilma Rousseff, assim como uma aproximação discreta em relação a lideranças do PSDB.
A queda no número de manifestantes também é significativa: mostra a percepção de que a simples presença nas ruas, mesmo que reúna milhões, não é capaz de alterar os rumos do governo, ou mesmo de suscitar a autocrítica nas cúpulas palacianas. O governo se acostumou a conviver com altos índices de rejeição popular, fazendo uso de um raciocínio que combina recortes pontuais da realidade com altas proporções de uma fantasia persecutória que vitimiza o PT; um enredo que curiosamente coloca como fraco o partido que exerce o poder há mais de uma década, controlando os bilhões do orçamento da União com singular desenvoltura. No mesmo sentido, reputar o descontentamento popular unicamente à crise econômica significa simplificar de forma conveniente o contexto político: afinal, protestos contra o governo vêm ocorrendo desde 2013, e mesmo nas eleições de 2014, as urnas mostraram o país claramente dividido. O desgaste petista vem se acumulando ao longo dos anos, e a negação desse fato não torna o partido mais apto a superar tais desafios.
Derrotado no campo da popularidade, o governo também enfrenta dificuldades no âmbito jurídico: a operação Lava Jato produz suas primeiras condenações, enquanto investigadores continuam encontrando novas ramificações na teia de agentes governistas que desviam recursos de contratos públicos. O cerco ao governo também se aperta devido ao julgamento das contas federais de 2014, algo que envolve diretamente Dilma Rousseff, sobretudo por seu conhecido zelo pela questão orçamentária. Acumulam-se, assim, ameaças reais em mais um flanco do governo.
No campo da política, foi rompido o isolamento quase total que afligia a Dilma Rousseff: uma trégua foi feita com o presidente do Senado, Renan Calheiros, o que dividiu temporariamente as forças do PMDB e enfraqueceu o movimento pró-impeachment que se alastrava pelo Legislativo. Essa ponte construída entre governo e PMDB é indispensável para que Dilma se sustente no poder, pois é capaz de evitar que a queda de sua popularidade, por si só, dê origem a um processo de impeachment.
A concomitância permanente entre as crises de popularidade, jurídica e de sustentação política do governo, que até se configurou por breves momentos no mês de agosto corrente, significaria um cenário fatal para o mandato de Dilma. É graças a um fragilíssimo equilíbrio, portanto, que foi adiada a formação da tempestade completa nos céus sobre Brasília.

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