sexta-feira, 15 de abril de 2016

Ventos do Planalto não sopram nas Gerais

por Paulo Diniz
(publicado na edição de 10/04/2016 de O Tempo - Belo Horizonte, Minas Gerais)

O rompimento entre PMDB e PT, visto pela maioria dos analistas como uma prévia das votações que definirão o impeachment de Dilma Rousseff, constitui-se como um dos mais importantes acontecimentos políticos do ano. Não apenas está em jogo o cargo maior da nação, como também a possibilidade de uma reação em cadeia que pode atingir a política brasileira como um todo: mesmo com as particularidades locais dos 27 estados e 5.570 municípios do país, é provável que a mais nova rivalidade brasileira gere efeitos drásticos nas eleições de outubro.
O caso de Minas Gerais merece destaque devido aos fatores que uniram os dois partidos. A surpreendente vitória de Fernando Pimentel em 2014, em primeiro turno, só foi possível porque o petista pôde contar com a presença absoluta que o PMDB tem no interior mineiro. Afinal, nem o passado de Pimentel, por demais vinculado a Belo Horizonte, e menos ainda sua campanha, restrita às cidades-polo do interior, o credenciavam para o sucesso que acabou acontecendo. A aliança com o PMDB, dessa forma, não se funda na necessidade de apoio legislativo, como ocorre no Governo Federal, mas sim na própria gênese do atual governo mineiro.
Assim, é possível imaginar que seja enorme a tentação para que o PMDB mineiro traia a aliança com o PT, reproduzindo e se aproveitando do cenário federal. A rapidez e decisão com as quais o vice-governador, Antônio Andrade, anunciou o rompimento em relação a Dilma Rousseff foram surpreendentes, principalmente considerando as profundas rivalidades que dividiam o PMDB mineiro há poucos meses. No mesmo sentido, o recente boicote dos deputados do PMDB a votações de interesse do governo na Assembleia Legislativa não contribui para dissolver a dúvida sobre a solidez da aliança entre os partidos.
Entretanto, o que difere profundamente as esferas federal da estadual, na consideração da aliança, é muito mais o acaso do que a atuação política das partes envolvidas. Em Minas, por exemplo, a gestão petista ainda é muito nova, não contando com o alto grau de desgaste acumulado pelo partido em escala nacional; em um possível embate, o PMDB mineiro não deve esperar contar com apoio popular. Na Assembleia Legislativa não se acumulam rancores em relação ao Executivo estadual, assim como ocorre no Congresso Nacional; esse fator de longo prazo, inclusive, talvez seja o maior responsável pelo horizonte de tempestade que aguarda Dilma na votação de seu processo de impeachment.
O fator definitivo a diferenciar os dois cenários é de ordem legal: os problemas que Fernando Pimentel enfrenta com a Justiça Eleitoral, relativos à sua campanha de 2014, envolvem igualmente seu companheiro de chapa do PMDB. Uma eventual cassação de mandato, portanto, não transferiria o poder a Antônio Andrade da mesma maneira como seu correligionário Michel Temer espera receber dentro de alguns dias. O posto de Fernando Pimentel está resguardado, por enquanto, da cobiça de seus companheiros de chapa devido apenas à conveniência do momento político.

O povo de Oliveira

por Paulo Diniz
(publicado na edição de 03/04/2016 de O Tempo - Belo Horizonte, Minas Gerais)

Em sua rica história política, Minas Gerais contou com a contribuição de todas as suas regiões para compor um conjunto de estadistas incomparável: Diamantina foi berço de Juscelino Kubitschek, enquanto a vizinha Bocaiuva produziu José Maria Alkmin, símbolo da habilidade dos políticos mineiros. São João del Rei foi berço de Tancredo Neves; já Barbacena deu origem ao clã dos Andradas, dinastia que articulou da Independência à Revolução de 1930. A Zona da Mata contribuiu com figuras que marcaram a história nacional: os presidentes Artur Bernardes e Itamar Franco, respectivamente de Viçosa e Juiz de Fora.
A cidade de Oliveira, no Centro Oeste, tem como seu filho mais famoso Eliseu Resende, que apesar de prolífica carreira, não compõe o time citado acima. Porém, o que parece encaminhar essa cidade para a história política é seu povo: a imprensa nacional acompanha com atenção a mobilização popular em Oliveira, contrária a um projeto de lei que propunha aumentar o salário dos vereadores do município, em plena crise fiscal. Com direito a altos e baixos, a presença popular na Câmara foi capaz não apenas de conter a ganância os edis locais, como também colocou em pauta propostas de redução do salário dos vereadores, uma delas para o nível do salário mínimo nacional, inédita no país.
Essa ação coletiva representa a soma de vários fatores, como o poder das redes sociais, a íntima relação que envolve o povo e seus representantes em cidades menores, assim como a maior disposição dos vereadores em ouvir as ruas quando há eleições por perto.
Como o caso ainda não teve seu desfecho, é preciso dotá-lo de certa perspectiva. Inicialmente, o tema da remuneração dos parlamentares merece visão mais serena: necessariamente, a redução drástica dos salários dos vereadores tende a afastar da política as pessoas que dependem do próprio trabalho para sobreviver, não podendo se dedicar à função pública voluntariamente. A tendência, a longo prazo, seria a de tornar a política uma atividade restrita às elites econômicas, reduzindo a representatividade da sociedade nas esferas de poder. Na prática, retornaríamos à doutrina que predominou até o século XIX, que vinculava a participação política à posse de certo nível de bens materiais; sem dúvida, seria um grande atraso em nossa democracia.
Outro ponto crucial a ser considerado é a indispensável transposição do ímpeto cívico da população para o âmbito da política formal. Por paradoxal que pareça, somente quando o povo assumir a posição daqueles que criticou, os vereadores, é que poderá ser vislumbrada uma mudança significativa na estrutura política da cidade. Os protestos massivos de 2013 servem de exemplo de que a mera revolta não deixa frutos se não conseguir tirar de cena os “culpados de sempre”. Portanto, para marcar definitivamente seu nome da história política mineira, o povo de Oliveira deve mostrar nas urnas uma renovação radical nos quadros do Legislativo municipal: eleger a si mesmo, por meio das novas lideranças que surgem.