segunda-feira, 25 de janeiro de 2016

A ingratidão do petróleo

por Paulo Diniz
(publicado na edição de 24/01/2015 de O Tempo - Belo Horizonte, Minas Gerais)

A queda no preço do barril de petróleo, para níveis que representam apenas 22,7% dos valores praticados em abril de 2011, tem sido um dos assuntos mais discutidos nas primeiras semanas de 2016. Além do noticiário econômico, esse fato também ocupa considerável destaque no meio político, e não apenas nas manchetes internacionais, mas também na política partidária brasileira. Essa dinâmica, que levou muitos a batizarem o século XX como a “era do petróleo”, continua plenamente vigente, o que nos obriga a acompanhar o desempenho do mercado desse produto para entendermos melhor o mundo em que vivemos. Nesse sentido, a tendência atual é de maior declínio no valor de mercado do produto, já que o Irã, um dos maiores produtores mundiais, acaba de ter suspensas as sanções econômicas impostas contra si pelos europeus e norte-americanos há vários anos.
No Brasil, a queda nos preços do petróleo acertou o ponto mais sensível do governo: a Petrobras. Não bastasse estar sofrendo uma grave crise de credibilidade, originada na descoberta do rombo de bilhões de dólares feito pela corrupção governista, a estatal brasileira agora vê suas perspectivas de recuperação minguarem consideravelmente, uma vez que o mercado tem valorizado muito pouco o produto básico de sua produção. O valor de mercado da maior estatal brasileira atinge profundidades abissais, o que fragiliza a ainda mais imagem da gestão petista devido à forma intensa pela qual essa empresa foi utilizada pela propaganda oficial nos últimos anos.
A aposta petista no petróleo começou com Lula, e teve seu maior combustível na descoberta das reservas localizadas na camada subterrânea do pré-sal, em 2006; nesse ano, o barril de petróleo circulava entre 59 e 75 dólares no mercado internacional. Em novembro 2009, quando a cotação do petróleo passava dos 78 dólares, Lula anunciou que o Brasil alcançava “um novo patamar” em termos de riqueza, e aproveitou a ocasião para criar mais uma empresa estatal, exclusivamente dedicada ao gerenciamento do pré-sal. O modelo da Petrobras, portanto, era considerado tão virtuoso, que gerou até uma descendente: a Petrosal, que nunca perdeu essa alcunha, apesar de carregar um nome oficial menos simpático. A partir daí, a marca dos 100 dólares por barril foi superada diversas vezes, como em agosto de 2013, quando a já presidente Dilma publicou o decreto que regulamentava a criação da Petrosal; o pico de US$ 125, em abril de 2011, levou as ilusões governistas às alturas, juntamente com alguns prefeitos e governadores, que acreditavam que a bonança nunca acabaria.
Hoje flutuando abaixo dos 30 dólares, o preço do petróleo indica que a aposta frustrada do PT cobra seu preço: a Petrobras, joia da coroa dos governos Lula e Dilma, é vista popularmente como corrupta e incompetente. Essa lembrança é cotidiana para o brasileiro, assombrado pelos altos preços que encontra quando vai aos postos de combustíveis, e não há agência publicitária no mundo capaz de melhorar o humor do cidadão nesse momento.

O desafio de Aécio

por Paulo Diniz
(publicado na edição de 17/01/2015 de O Tempo - Belo Horizonte, Minas Gerais)

Sendo 2016 um ano de eleições municipais, um dos lugares comuns mais recorrentes será afirmar que os resultados dos pleitos locais serão decisivos para o embate de 2018; nada mais certo. Porém, além desse fator, temos agora uma novidade: a carência de recursos para as campanhas eleitorais, decorrência da crise financeira e das restrições de nova legislação eleitoral. Mais do que em qualquer outro momento, as lideranças políticas federais e estaduais vão precisar estar presentes no maior número de municípios possível, compensando com seu carisma pessoal a falta de recursos financeiros; em 2016, essa será a regra do jogo. Nesse contexto, chama a atenção a postura do senador Aécio Neves, que dá sinais de não ter compreendido essa mudança de ventos: a julgar pela forma como vem evoluindo o panorama em Minas, esse erro pode ser politicamente fatal.
Derrotado nas eleições de 2014 por uma das menores margens da história republicana, Aécio se credenciou como uma referência nacional. Hoje mais popular do que Lula, ele faz bem em ter foco sobre o Brasil como um todo. Porém, para tornar seu potencial político uma realidade, há muitos obstáculos adiante. O primeiro deles é o próprio PSDB, na forma de seus bizantinos mecanismos de decisão interna: em 2014, foi preciso um esforço enorme para que o partido não indicasse, pela sexta vez consecutiva, um paulista como candidato à Presidência da República.
Mais importante do que esse desafio, entretanto, existe para Aécio outro, que não só pode ter efeito sobre seu futuro, como também pode ameaçar sua própria sobrevivência política: a batalha pela presença nos 853 municípios de Minas Gerais. Apesar de já figurar na política desde a década de 1980, Aécio apenas alcançou o destaque atual a partir de suas duas gestões de sucesso como governador de Minas. Nesse período, foi possível estabelecer contato muito próximo com os prefeitos mineiros, inclusive com muitos filiados a partidos que lhe faziam oposição. Essa foi a base da força de Aécio Neves, que lhe deu impulso para chegar ao protagonismo nacional em 2014. Desde então, as coisas vêm mudando rapidamente: PT e PMDB dirigem a máquina estadual, com plenas condições de ajudar na eleição de aliados em centenas de cidades, enquanto o PSB de Márcio Lacerda vem conquistando aliados de peso pelo interior mineiro.
Longe do poder estadual e perdendo espaço no interior, Aécio só tem a oferecer sua presença aos candidatos municipais esse ano; e é urgente que o faça, em doses maciças. Uma pesquisa rápida em seu site oficial mostra que, em 2015, o senador não compareceu em nenhuma ocasião a cidades mineiras de importância crucial como Uberlândia, Varginha, Governador Valadares e Montes Claros. Cada uma exerce forte liderança política sobre centenas de municípios em suas respectivas regiões, sendo que essa última é indispensável para se obter bom desempenho no Norte de Minas: exatamente a área na qual, em 2014, a fraca votação de Aécio Neves lhe custou o acesso ao Palácio do Planalto.

quinta-feira, 14 de janeiro de 2016

Quem dá as cartas?

por Paulo Diniz
(publicado na edição de 10/01/2016 de O Tempo - Belo Horizonte, Minas Gerais)

Diferente da tradição acumulada desde 1822, a atuação brasileira no campo da política internacional tem sido marcada em anos recentes por rompantes e incoerências. O caso do momento envolve o Estado de Israel, cujo embaixador nomeado para representa-lo Brasília vem sendo recusado desde agosto passado, não diretamente pela administração de Dilma Rousseff, mas por movimentos sociais ligados ao governo. O motivo da discórdia é a indicação, para chefiar a embaixada de Israel, de Dani Dayan, que entre 2007 e 2013 presidiu a maior associação de assentamentos israelenses em territórios ocupados aos palestinos; a comunidade internacional, em sua maioria, considera ilegal tal colonização e defende a devolução dessas terras.
Quando se trata dos assentamentos israelenses, o Brasil faz coro a diversos outros países em sua crítica ao governo de Israel, o que torna nossa postura política não só legítima como também comum. O que ultrapassa os limites da lógica, assim, não é o conteúdo do posicionamento nacional, mas sim a maneira como o Brasil define e coloca em prática sua política externa. A indicação de Dayan foi vetada não apenas pela discordância em relação aos assentamentos, mas principalmente sob a justificativa de que o nome do novo embaixador israelense foi considerado inaceitável por movimentos sociais como o MST e a CUT. Supondo que tais organizações tenham apenas se voluntariado para aparecer como responsáveis pela decisão, a administração de Dilma Rousseff faz má figura na política internacional: a política externa do governo petista transmitiria a imagem de fraqueza da presidente, uma vez que essa não teria forças diante da negativa desses movimentos sociais.
Outra interpretação possível, que não leva em conta a hipótese da força dos movimentos sociais, deixa no ar uma pergunta: por quê, então, não poderia a presidente assumir seus próprios posicionamentos, colocando-os como a vontade soberana de um governo democraticamente eleito? Mais uma vez, portanto, transmitimos uma imagem de fraqueza e inconstância, reforçada pelo próprio fato de que quem mais tem atendido à imprensa, para esclarecer sobre o assunto, são os movimentos sociais, que sequer compõem os quadros da burocracia federal.
Independente da orientação política do governo da vez, a diplomacia brasileira sempre foi muito eficiente na realização das missões que lhe foram confiadas, o que a tornou reconhecida e respeitada pelo mundo. Caso pudesse agir como de costume, certamente a diplomacia brasileira seria capaz de lidar com o caso Dayan de maneira mais hábil e sutil do que o que vemos hoje: um quadro de estardalhaço e acirramento político que não deve produzir resultados positivos para o Brasil ou Israel.
Já os movimentos sociais em questão, agora expandindo sua área de controle para a política externa, certamente estão tendo seus interesses satisfeitos, pois frequentam agora o noticiário internacional. Enfim, como de costume no Brasil, os ganhos de poucos se dão às custas da perda de muitos.