por Paulo Diniz
(publicado na edição de 27/04/2012 do Estado de Minas - Belo Horizonte, Minas Gerais -, na edição de 03/05/2012 do Tempo - Belo Horizonte, Minas Gerais -, na edição de 03/05/2012 do Jornal de Uberaba - Uberaba, Minas Gerais - e na edição de 26/04/2012 do Correio do Sul - Varginha, Minas Gerais)
O conturbado cenário
político argentino produziu, mais uma vez, manchetes preocupantes no noticiário
econômico. Com um golpe certeiro de sua caneta presidencial, Cristina Kirchner
tomou da empresa espanhola Repsol a propriedade da petrolífera YPF, uma
ex-estatal Argentina privatizada em 1992. O fato não constitui novidade, pois
já ocorreu várias vezes no continente, sob nomes diversos: expropriação,
encampação, nacionalização são alguns dos termos, aos quais se soma a
“declaração de utilidade pública”, inaugurada por Cristina. O que chama a
atenção, agora, são os interesses brasileiros envolvidos, principalmente quando
se leva em conta as tendências políticas do governo vizinho.
Inicialmente,
é preciso considerar os fatores favoráveis à Argentina: a privatização da YPF
faz, desde os anos 1990, parte do folclore nacional como sinônimo de um negócio
mal feito. Também parece válido o argumento de que os espanhóis da Repsol
vinham conduzindo a YPF de maneira pouco competente, o que gerava conseqüências
para a economia argentina: pela primeira vez em sua história recente, em 2011,
o país se viu obrigado a importar combustíveis. Entretanto, para cada um desses
problemas há soluções menos radicais, como a alteração das condições de
funcionamento do mercado, ou outras medidas de caráter político, como mudanças
pontuais na legislação vigente. Qualquer dessas medidas seria capaz de gerar
resultados diante dos problemas apontados pelos argentinos, porém nenhum deles
produziria o terremoto político que uma nacionalização, como a feita agora por
Cristina, é capaz de causar.
Ávida por
índices de popularidade melhores, Cristina Kirchner aguardou o encerramento do
pregão da bolsa de valores de Madrid para desferir seu golpe contra a moribunda
economia espanhola. Convocou reunião com as principais lideranças políticas do
país – governadores e senadores, que gritavam e cantavam como se estivessem em
um estádio de futebol – e anunciou seu decreto, rodeada por imagens de Evita
Perón. A cena, transmitida em cadeia nacional, compõe um quadro – literalmente
– gritante da euforia e do descontrole populistas que tomaram conta da
Argentina.
Inevitável não
temer pelo destino da subsidiária da Petrobrás na Argentina. Ainda está nítido
na memória dos brasileiros o episódio no qual o governo da Bolívia se apossou
das instalações da Petrobrás naquele país, em 2006, usando tropas do exército
diante de equipes de televisão. O quadro econômico boliviano pouco mudou com o
episódio, mas a bravata nacionalista de Evo Morales o fortaleceu o suficiente
para vencer uma eleição presidencial e um plebiscito constitucional.
Após décadas
de populismo, e das inexoráveis decepções no médio prazo, a América Hispânica
continua suscetível ao apelo de “salvadores da pátria”. O desenvolvimento
econômico recente do Brasil coloca nosso país como candidato natural ao papel
de “vilão imperialista”, sempre culpado pelas mazelas alheias. A província
argentina de Neuquém, no início do mês, já suspendeu a concessão da Petrobrás
em seu território: o sinal amarelo foi aceso.