por Paulo Ricardo Diniz Filho
publicado na edição de 1º de agosto de 2023 de O Tempo - Belo Horizonte, Minas Gerais
O
caso da Flórida
Considerando
um ponto de vista científico, sempre foi questionável a associação entre a
eleição de Donald Trump nos EUA em 2016 e a vitória de Jair Bolsonaro no Brasil
em 2018. Afinal, é difícil conjecturar que dezenas de milhões de eleitores
brasileiros se inspirem nos EUA no momento de decidir em quem votar.
Porém,
tendo em vista as coincidências, é interessante manter um olhar atento sobre o
cenário pré-eleitoral dos EUA. No final de agosto, ocorrerá o primeiro debate
entre os pré-candidatos à Presidência pelo Partido Republicano: nos Estados
Unidos, quem decide as candidaturas definitivas de cada partido são os
eleitores, em votação direta.
O
ex-presidente Donald Trump é favorito, clamando por vingança contra a imaginada
fraude eleitoral que o vitimou em 2020 – enfim, traz mais do mesmo. Seu principal
opositor dentro do Partido Republicano, entretanto, é uma figura essencial para
a compreensão dos caminhos futuros da direita ideológica nos EUA – e, quiçá,
também no Brasil. Ron De Santis é governador da Flórida, cumprindo seu segundo
mandato; além de trazer crescimento econômico inédito para seu estado, De
Santis também é responsável pela efetivação de políticas conservadoras que
beiram o extremismo.
Fiscalização
do conteúdo dos livros infantis de todas as escolas públicas, banimento da
realização de abortos em gestações de mais de seis semanas, proibição de
atletas trans em competições esportivas: essas são algumas medidas de cunho
conservador que De Santis propôs e conseguiu aprovação junto ao Legislativo
Estadual. Esses são temas extremamente importantes para o eleitorado de direita
nos EUA, e o governador da Flórida mostra realizações concretas nesse sentido.
Ao mesmo tempo, Trump continua seus discursos desconexos e rancorosos nas redes
sociais, em conflito até mesmo com seu próprio legado presidencial.
O
sucesso de Ron De Santis é fruto de seu estilo pessoal: meticuloso no planejamento
e agressivo na execução, envolveu-se profundamente nas eleições legislativas,
conseguindo não apenas maioria absoluta, como fidelidade total de sua base de
deputados estaduais. Todo e qualquer espaço de poder foi ocupado por
partidários de De Santis – incluindo conselhos escolares – o que garantiu poder
absoluto ao governador. Políticos republicanos de outros estados já foram à
Flórida para aprender com De Santis seu “estilo de governo”, e isso tem
garantido a ele espaço de sobra na mídia nacional.
Porém,
os apoiadores do Partido Republicano ainda confiam mais na algazarra de Trump
do que na eficiência metódica de De Santis: o ex-presidente tem a preferência
de 52% de seus correligionários, enquanto o governador da Flórida recebe o
apoio de apenas 15% dos eleitores de seu partido em escala nacional.
Esse
pequeno panorama pode nos dizer, portanto, que o eleitorado da direita talvez
se guie mais pela aparência do que pelo conteúdo, mais pelo coração do que pela
razão. Se for válida também para o Brasil, essa tendência tem que estar
presente em nosso radar político.