terça-feira, 27 de janeiro de 2015

O que esperar para 2015

por Paulo Diniz
(publicado na edição de 25/01/2015 de O Tempo - Belo Horizonte, Minas Gerais)

Profundo conhecedor do panorama político brasileiro, o ex-governador mineiro Magalhães Pinto cunhou a frase na qual compara a política às nuvens: a cada vez que se olha, vê-se tudo diferente. Essa lógica nos ensina que prognósticos de longo prazo, no Brasil, têm pouca validade. Assim, analisar os eventos que virão em 2015 só tem valor por indicar as principais articulações que deverão acontecer nesse ano.
Um evento que não é novidade, mas que deve gerar estresse político, é a formalização da Rede Sustentabilidade, o partido liderado por Marina Silva que não conseguiu cumprir as exigências legais para disputar as eleições de 2014. Além do suspense quanto à efetivação do partido até outubro, prazo legal para participar das eleições municipais de 2016, há também a questão das migrações partidárias, que são facilitadas pela criação de nova agremiação política. A senadora petista Marta Suplicy, a julgar pela forma inédita e agressiva com a qual passou a criticar seu partido junto à imprensa, oferece uma prévia do quão turbulentas podem se tornar essas articulações pessoais. Afinal, não basta alterar o registro partidário, é preciso justificar aos eleitores a moralidade da troca, assim como à Justiça Eleitoral a incompatibilidade ideológica com o partido que se deixa; assim fazendo, Marta evita o risco de ficar sem mandato eletivo no futuro próximo. Como ela, muitos outros podem fazer esse ruidoso tipo de troca.
Também facilmente previsíveis para o ano que começa são os maus bocados do governo de Dilma Rousseff com o Parlamento brasileiro. Seguindo-se à muito comentada mudança na forma de tratamento do PT para com o PMDB, que passou a receber postos ministeriais de menor importância, deve-se seguir uma reação legislativa por parte do partido que detém a maior bancada do Senado e a segunda maior da Câmara dos Deputados. A eleição para a Presidência da Câmara, marcada para dois de fevereiro, deve dar corpo a esse burburinho de insatisfação, e caso Dilma não opte pelo caminho da conciliação, teremos um 2015 de muitos confrontos no Parlamento nacional. Com um flanco desguarnecido pela torrente de escândalos que brota da Petrobras, a presidente tem muito mais a perder do que a ganhar se decidir medir forças com o PMDB. De toda forma, todos os envolvidos irão preferir definir essas questões ainda em 2015, já que não é ano eleitoral.
Desse conturbado contexto, composto também pelas crises da economia e do setor energético, o ex-presidente Lula deve se manter o mais distante possível: preservará sua imagem pessoal visando 2018, voltando à cena quando reaparecerem as boas notícias no cotidiano dos brasileiros.
O mais importante de 2015, entretanto, não depende dos políticos, mas sim de cada um dos milhões de brasileiros que se envolveram na disputa eleitoral do ano passado como há muito não se via acontecer: será preciso fazer uso de todos os canais para marcar presença junto aos eleitos, indicando que democracia é muito mais do que o simples registro do voto na urna.

segunda-feira, 19 de janeiro de 2015

Terrorismo como ferramenta política

por Paulo Diniz
(publicado na edição de 18/01/2015 de O Tempo - Belo Horizonte, Minas Gerais)

O ano de 2015 se inicia sob o signo do terrorismo internacional, confirmando a tendência atual de expansão desse tipo de conflito. Não apenas persiste o grupo armado Estado Islâmico a ganhar corpo e ocupar territórios do Iraque e da Síria, como também os atentados de Paris trouxeram à tona uma série de temas importantes, como a liberdade de expressão e o comportamento dos grupos extremistas compostos por nativos da própria Europa. É preciso perceber, entretanto, que apesar do custo humano derivado de tal atividade militante, quando se considera a perspectiva política e o longo prazo, o terrorismo não representa uma ameaça concreta aos governos estabelecidos.
Tomando por base o Oriente Médio, foco de tensões que deu origem a diversos conflitos armados, temos como exemplo a luta do povo palestino pela criação de seu próprio Estado. Até o final da década de 1960, eram bem simples as ações militares não convencionais dos nacionalistas palestinos contra Israel: emboscadas de pequenas proporções, sobretudo contra o aparato de segurança do Estado Judeu nos territórios por esse ocupados. Quando tais agressões passaram a ser realizadas internacionalmente, as lideranças palestinas perceberam o potencial político e propagandístico que haviam despertado: todo o planeta passou a conhecer a causa pela qual lutavam, graças à massiva cobertura da imprensa, de forma que também angariaram novos aliados e apoios a partir da notoriedade obtida. A Europa, na década de 1970, viveu um autêntico jogo de gato e rato, no qual agentes de Israel buscavam secretamente evitar ataques terroristas e neutralizar seus autores, enquanto militantes extremistas palestinos ousavam cada vez mais, contando com a simpatia de boa parte do público e dos governos europeus. O resultado obtido, entretanto, foi politicamente nulo: a violência passou do ponto em que podia ser considerada justificável pela opinião pública, sendo vista então apenas como radicalismo estéril.
Como contraponto, vale mencionar o quadro atual, que mesmo ofuscado pelos eventos de Paris ilustra bem os limites da violência no jogo político: nos primeiros dias de 2015, a Autoridade Nacional Palestina solicitou adesão ao Tribunal Penal Internacional, órgão ligado à ONU e dedicado principalmente a julgar crimes contra a humanidade. Mesmo antes de receber aval positivo da ONU a seu pedido, já que ainda não compõe um Estado propriamente dito, a ANP sofreu sanções financeiras de Israel e duras críticas dos EUA, o que indica que os palestinos conseguiram atingir a essas duas potências militares. De fato, uma eventual denúncia da ANP contra ações militares israelenses nos territórios palestinos geraria grande desgaste político a Israel diante do mundo, mesmo que esse país não componha o Tribunal.
Quando ações políticas bem calculadas geram resultados mais eficientes que o terrorismo, é possível pensar que essa categoria de ação tem seus dias contados: no longo prazo, as letras se mostram instrumentos mais eficientes do que a espada.

quarta-feira, 14 de janeiro de 2015

Dois anos cruciais

por Paulo Diniz
(publicado na edição de 11/01/2015 de O Tempo - Belo Horizonte, Minas Gerais)

Há dois anos, o deputado federal Júlio Delgado se encontrava no centro da disputa pela Presidência da Câmara dos Deputados: aproximando oposição e os insatisfeitos da ala governista, sua plataforma de candidatura parecia indicar o surgimento de uma nova força na política nacional, gerando expectativas para o que viria em 2014. Hoje Delgado está na mesma posição, porém o contexto à sua volta se alterou a ponto de emprestar significado diverso à sua atual candidatura. Compreender essas mudanças significa não apenas realizar retrospectiva da política brasileira nos últimos anos, como também revisar o sistema político nacional.
No início de 2013, Julio Delgado despontava como elemento de ligação entre a oposição tucana e a liderança ascendente de Eduardo Campos, o presidente do PSB que então afastava cada vez mais seu partido da órbita petista. Havia, assim, muita expectativa em relação à votação que Delgado atrairia na Câmara, e também no que tocava ao cenário presidencial de 2014, quando o apoio do PSB poderia gerar respaldo político renovado ao PSDB. Nos bastidores da campanha de Delgado, Aécio Neves e Eduardo Campos torciam pelo sucesso desse primeiro experimento de aproximação entre seus projetos políticos, que pareciam convergir para uma chapa conjunta para a disputa pela Presidência da República no ano seguinte. A polarização da eleição da Câmara contra o governista Henrique Eduardo Alves, do PMDB, assim como o momento político tranquilo pelo qual passava o Brasil, inviabilizaram a vitória da plataforma de Julio Delgado; porém, a votação obtida foi encorajadora.
Desde então, tudo mudou: protestos populares, estagnação econômica, Copa do Mundo, empate técnico no segundo turno presidencial de 2014 e o escândalo da Petrobras foram alguns fatores que causaram grande abalo na sustentação política de Dilma Rousseff. Já no PSB, a filiação surpreendente de Marina Silva, o rompimento formal com o PT, o falecimento de Eduardo Campos e ascensão e queda vertiginosas da candidata do partido na campanha do ano passado colocaram o PSB como protagonista nacional. O candidato Julio Delgado, nesse sentido, passa de teste de viabilidade em 2013 ao posto de representante de uma corrente política em crescimento em 2015.
Outra diferença entre os cenários de 2013 e 2015 é o quadro das demais candidaturas à presidência da Câmara: diferente da unidade do passado, hoje há duas lideranças dividindo a base governista, Arlindo Chinaglia pelo PT e, pelo PMDB, um tradicional desafeto de Dilma, Eduardo Cunha. Essa rivalidade no campo do governo representa oportunidade para Julio Delgado, que deixa de ser alvo preferencial dos outros principais candidatos.
O descontentamento do PMDB diante das nomeações ministeriais de Dilma promete um ano delicado para o governo, que já demandava apoio legislativo como nunca, fragilizado que está pelas investigações na Petrobras. Nesse complexo momento político, é difícil achar alguém em posição mais estratégica que o juiz-forano Julio Delgado.