(publicado na edição de 26/04/2015 de O Tempo - Belo Horizonte, Minas Gerais)
Notícias relacionadas à fuga de refugiados para a
Europa têm marcado o noticiário internacional de maneira espantosa nos últimos
meses: os resgatados contam-se aos milhares, enquanto desaparecidos e vítimas
mortais se somam às centenas. Apenas em
2014, cerca de 200 mil pessoas tentaram atravessar o mar Mediterrâneo em
embarcações impróprias e superlotadas, em busca de uma vida de paz e
estabilidade nas ex-potências coloniais europeias. Nesse contexto, mais de três
mil pessoas perderam a vida, o que configura o mais recente drama humanitário
mundial.
A proximidade geográfica, assim como os antigos
laços coloniais, faz da Itália o principal destino dos que fogem da Etiópia,
Eritréia e principalmente da guerra civil na Líbia, que se estende desde 2011
sem o predomínio de qualquer facção no comando do país. Nos últimos meses, o
avanço de grupos radicais associados ao Estado Islâmico nesse conflito adicionou
um elemento de pânico ao drama vivido pelos civis da região.
Tendo em vista tal situação, a Itália lançou em
2013 a operação "Mare Nostrum", na qual se encarregava de buscas
ativas e salvamentos de embarcações que apresentassem dificuldades,
configurando uma iniciativa responsável pela preservação de dezenas de milhares
de vidas.
A temática da segurança, entretanto, passou a
superar recentemente as preocupações humanitárias, na medida que cresceram os
temores de que elementos radicais político-religiosos se misturassem à onda de
refugiados para conseguir entrada à Europa em grandes números. Em novembro de
2014, a iniciativa italiana, que havia sido inspirada também por súplicas
diretas do Papa Francisco em favor dos refugiados, passa a dar lugar à operação
conjunta europeia batizada "Triton", em homenagem à divindade
marítima da mitologia grega.
O objetivo da ação militar é de defesa de
fronteiras, valorizando a repressão de poucos sobre o salvamento de muitos. A
pequena força naval destacada para tal tarefa, composta de embarcações portuguesas,
finlandesas e holandesas, tem ordens para resgatar apenas mediante pedidos
explícitos de socorro, e mesmo assim, dando preferência nessa tarefa às
embarcações civis que estiverem mais próximas do local onde o resgate foi
solicitado. Mais importante, ainda, é que a nova operação da União Europeia
representa apenas um terço do orçamento da ação italiana que a precedeu, o que
condiz com os tempos de crise econômica pelos quais passa boa parte da Europa.
De toda forma, em que pese a opção pela força em
detrimento da fraternidade, é previsível que a ação europeia redunde em
fracasso. Serve de exemplo o caso dos EUA, historicamente incapazes de conter o
fluxo de imigrantes ilegais mexicanos para seu território. Mediante tal
perspectiva de sofrimento humano, é urgente que as lideranças europeias aceitem
uma das mais concretas verdades do mundo globalizado: crises políticas não mais
se resolvem regionalmente, a partir de ações locais, mas apenas em âmbito
global, tão amplo quanto as origens dos problemas do mundo atual.