domingo, 2 de agosto de 2015

Eduardo Cunha: o involuntário aliado de Dilma

por Paulo Diniz
(publicado na edição de 02/08/2015 de O Tempo - Belo Horizonte, Minas Gerais)

A crônica política brasileira, que vem registrando surpresas a uma velocidade incrível, foi surpreendida pelas declarações recentes de Eduardo Cunha: não apenas se assumiu como oposição, como também autorizou a abertura de duas CPIs que desagradam ao Governo Federal. A associação entre as duas declarações foi inevitável, indicando que o presidente da Câmara dos Deputados vai fazer uso de sua posição institucional para enfrentar Dilma Rousseff, mesmo que o próprio Cunha tenha negado protocolarmente essa nova atuação. Dois aspectos chamam a atenção nesse posicionamento de Eduardo Cunha, sendo que em ambos há pontos de contato com o PT.
O primeiro indica o quão benéfica a nova atuação de Cunha pode ser para Dilma: tomando a frente do amplo grupo de adversários da atual presidente, Eduardo Cunha acaba por encarnar o personagem do “inimigo golpista”, central para a estratégia de defesa petista. Desde o início da crise da Petrobrás, um dos fatores que mais prejudicou a reação do governo foi a leitura equivocada da conjuntura política: os petistas acreditavam ser vítimas de um plano, patrocinado pelas “forças reacionárias”, dedicado a afastar o PT do poder. A fé nesse enredo conspiratório fez com que as lideranças petistas não se dessem conta dos próprios erros, responsáveis pelo desgaste do governo em relação à quase unanimidade da população. Desligado da sociedade, o governo de Dilma vinha investindo em estratégias equivocadas para recuperar a popularidade.
Porém, quando Eduardo Cunha passa a investir furiosamente contra a presidente, assume o papel do conspirador reacionário, emprestando veracidade do delírio persecutório dos petistas. A simplicidade do duelo entre os bons e os maus, que orienta o raciocínio petista na atual crise, ganhou sentido e legitimidade. Essa situação foi percebida com rapidez pela direção do PMDB, que se apressou a rotular a atitude de Cunha como pessoal e contrária ao posicionamento oficial do partido. Mesmo assim, o dano político já estava feito: as articulações do partido para a retirada de Dilma do poder foram explicitadas.

O outro ponto interessante no episódio em questão se refere à motivação de Eduardo Cunha para investir de forma agressiva, explícita e até imprudente contra o governo de Dilma: a crença de que as investigações da Polícia Federal, que ligam seu nome ao escândalo da Petrobrás, tivessem origem política e autoria governista. Trata-se, afinal, da mesma paranóia conspiratória nutrida pelo petismo governante, só que atribuída ao próprio Eduardo Cunha e a setores da oposição formal. Dessa forma, temos uma surreal inversão de valores: ambas as partes preferem imaginar e reagir a complicados enredos de articulações políticas urdidas contra si, do que encarar a realidade segundo a qual Poder Judiciário e Polícia Federal têm feito um incomum trabalho para combater os corruptos do Brasil. Continuando essa tendência de negação da realidade, muitas serão as vítimas dessa luta política desesperada, e não haverá vencedores.

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