quinta-feira, 12 de novembro de 2015

Todos os olhos sobre Cunha

por Paulo Diniz
(publicado na edição de 01/11/2015 de O Tempo - Belo Horizonte, Minas Gerais)

A divulgação de notícias cada vez mais fundamentadas de que o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, mantém recursos não declarados no exterior ameaça mudar o cenário da crise política que atinge o Governo Federal. É consenso entre os analistas políticos dizer que, sob as atuais condições, toda previsão é plausível, até mesmo as mais mirabolantes. O ponto central, por isso, deve ser a importância que se atribuiu à figura de Eduardo Cunha, visto agora como protagonista da cena política de 2015.
Há de se questionar se é mesmo possível que apenas um personagem seja capaz de tamanho tumulto, como o que testemunhamos. Primeiramente, é importante destacar que as relações no âmbito da coalizão governista já vinham se aproximando da ruptura há algum tempo: o rompimento do PSB de Eduardo Campos, em setembro de 2013, indicava que o número de partidos, lideranças e interesses a serem conciliados havia se tornado grande demais, mesmo para um governo que tinha quase 40 ministérios. O potencial para conflito na base governista era latente e antigo, sendo impreciso imputar a Eduardo Cunha o protagonismo da atual rebelião partidária.
O mesmo pode ser dito em relação à Câmara dos Deputados, onde parlamentares governistas acumulavam rancores contra Dilma por motivos que iam desde o atraso nas nomeações de seus indicados para cargos no Governo Federal, até a demora no pagamento das emendas parlamentares. A própria eleição de Cunha, em fevereiro, para a liderança da Casa, pode ser vista como sinal de insatisfação da base governista, e não apenas como fruto de uma capacidade de articulação política extraordinária, que se atribuiu inicialmente ao líder do PMDB fluminense.
A impopularidade da presidente Dilma, atingindo recordes históricos na atual democracia brasileira, pode ser atribuída grandemente à crise econômica que gerou efeitos cada vez mais perceptíveis pela população ao longo de 2015. Também os sucessivos escândalos de corrupção e a própria fadiga da opinião pública em relação aos métodos e discursos do governo, após mais de uma década de gestão petista, podem ser mencionados como causadores do desgaste da imagem de Dilma. Nesse contexto, normalmente, é comum que aliados reflitam sobre a utilidade de permanecer associados a um governo impopular, sob o risco de sofrerem também eles danos em suas imagens pessoais. Assim, quando Cunha se declarou oficialmente como adversário do governo, provavelmente sua única diferença em relação a outras centenas de deputados da base aliada foi a franqueza de seu discurso e os holofotes que esse atraiu. Sua ação, portanto, condiz mais com o comportamento do rebanho, do que com o do pastor.
Uma visão mais ampla do quadro político nacional, portanto, é capaz de colocar em perspectiva o protagonismo de Eduardo Cunha em relação aos eventos do turbulento ano de 2015. Seu futuro pessoal, em risco pelo envolvimento com o escândalo da Petrobrás, não melhora em quase nada as perspectivas políticas do governo de Dilma Rousseff.

Um comentário: