segunda-feira, 31 de outubro de 2016

Vem aí mais uma "reforma política"

por Paulo Diniz
(publicado na edição de 02/10/2016 de O Tempo - Belo Horizonte, Minas Gerais)

Uma importante manchete estampará os jornais na semana pós-eleições: vem aí outra “reforma política”. Se não ocorrer imprevisto, o projeto de emenda Constitucional 36/2016 deverá ser votado no Senado nos primeiros dias úteis de outubro, com o objetivo de alterar novamente as regras eleitorais. A julgar pela articulação feita em torno da proposta por seus autores, os senadores Aécio Neves e Ricardo Ferraço, a aceitação por parte dos colegas deve ser rápida, encaminhando a matéria para a Câmara dos Deputados ainda em 2016.
São três os objetivos de tal projeto: endurecer as regras de fidelidade partidária, conter a proliferação de partidos políticos, além de proibir coligações partidárias para cargos de eleição proporcional (deputados e vereadores). Não há dúvida de que, tecnicamente, as medidas que compõem a PEC 36 são apropriadas para a finalidade desejada: dotar o sistema político brasileiro de coerência, dando aos partidos certa identidade ideológica e, assim, colocando as ideias no centro das coalizões políticas. Essa estratégia, não sem razão, parte do pressuposto de que muitos partidos políticos são guiados unicamente pelas possibilidades de ganhos eleitorais e materiais de seus líderes, o que os torna apoiadores políticos dispendiosos e, ainda assim, volúveis. Destacam-se, nesse contexto, os partidos de menor expressão, muitas vezes dispostos a abrigar figuras políticas famosas para se habilitarem a esse jogo.
Entretanto, é preciso ter em mente que sistemas eleitorais influem, mas não determinam a forma como se faz política em uma sociedade: as regras podem facilitar ou dificultar certas artimanhas utilizadas pelos políticos, porém a força determinante em última instância é a avaliação popular dos perfis e propostas apresentados nas urnas.
Por definição, a política é um processo de negociação coletivo para que sejam definidas as ações e prioridades do Estado. Essa dinâmica ocorre de várias maneiras, sendo a mais evidente a vigência do jogo eleitoral: serve como critério decisivo o número de apoiadores que se declaram em favor de cada plataforma. Em poucas palavras, enquanto persistir essa lógica, os valores e crenças da sociedade brasileira continuarão a se expressar claramente nas urnas, pouco influindo o conjunto de regras eleitorais em vigor. Enfim, muito pouco mudará na política brasileira se não mudar, em primeiro lugar, o próprio eleitor brasileiro.
A opinião pública brasileira reproduzirá uma falácia desgastada, se depositar suas esperanças na reforma eleitoral que está por vir. Isso porque não haverá mudança política no Brasil enquanto não for alterada a maneira como a sociedade percebe e participa das questões coletivas. A política, afinal, é reflexo da sociedade, de forma que as mazelas daquela têm raízes em cada indivíduo. Não há, portanto, uma fórmula eleitoral “mágica”, esperando para ser descoberta e testada em nosso país, que seja capaz de reparar a política brasileira. Apenas com engajamento e aprendizado coletivos haverá solução.

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