segunda-feira, 31 de outubro de 2016

Nadando contra a correnteza: o desenvolvimentismo mineiro

por Paulo Diniz
(publicado na edição de 31/07/2016 de O Tempo - Belo Horizonte, Minas Gerais)

O recente passamento do ex-governador Rondon Pacheco ensejou uma série de retrospectivas de sua trajetória política e administrativa; seu papel fundamental na instalação da indústria automobilística em Minas Gerais foi sempre destacado. Outro fato, divulgado ao mesmo tempo, foi a queda de 25,4% na venda de veículos novos no primeiro semestre do ano, em comparação com 2015. Aparentemente desconexas, tais informações em conjunto ilustram a importância que a indústria automotiva ganhou na economia brasileira nos últimos anos, sendo hoje um dos principais termômetros da crise atual.
Governador de Minas entre 1971 e 1975, Rondon Pacheco foi eleito de maneira indireta pelos deputados estaduais. Afinal, eram os piores anos da ditadura, durante os quais o voto direto só era permitido para o legislativo e para o comando de pequenas e médias cidades. Independentemente da forma como chegou ao poder, Pacheco fez uso desse para colocar em prática um importante programa de dinamização da indústria mineira, crucial para que o estado mantenha até hoje o posto de segundo maior polo industrial do Brasil. A implantação da indústria automotiva foi, na verdade, o ápice de uma estratégia mais ampla.
A fórmula utilizada por Rondon Pacheco não era novidade, pois já vinha sendo utilizada intensivamente no país desde meados da década de 1950. Trata-se do receituário tradicionalmente conhecido como desenvolvimentismo, que ganhou contornos mais precisos após ser sistematizado no final dos anos 1940 pelos economistas da Comissão Econômica para a América Latina e Caribe, órgão da ONU. Com adaptações nacionais, tal roteiro econômico incluía a concessão de benefícios fiscais às indústrias estrangeiras que se instalassem no país, proteção dessas contra a concorrência de produtos importados e, com frequência, a própria participação do Poder Público como financiador ou sócio desse tipo de empreendimento industrial. O sucesso dessa estratégia no Brasil foi retumbante, sobretudo a partir do governo de Juscelino Kubitschek, durante o qual o país se tornou uma nação industrial.
É importante destacar, entretanto, que o desenvolvimentismo no Brasil teve um componente político pouco lembrado em sua origem: em acordo com a elite política paulista para garantir a governabilidade de sua gestão, Kubitschek concordou em concentrar em São Paulo a onda de indústrias que era atraída ao Brasil. Iniciativas como a de Pacheco, duas décadas depois, tiveram o incalculável mérito de contrapor a perversa tendência de concentração da riqueza industrial na capital paulista. O desenvolvimentismo mineiro, quase sempre implementado com pouco apoio do Governo Federal, se destaca não apenas pela autonomia, mas também pela tenacidade em lutar para evitar que Minas naufragasse na pobreza.
É fato que a luta autônoma pelo desenvolvimento de Minas não começou e nem terminou com Rondon Pacheco, mas esse governador sem dúvida foi um de seus destaques. Que seu exemplo inspire a atual geração de gestores públicos mineiros.

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