por Paulo Diniz
(publicado na edição de 15/05/2016 de O Tempo - Belo Horizonte, Minas Gerais)
O
afastamento de Dilma Rousseff do poder vem despertando uma série de dúvidas sobre
a origem da atual conjuntura política; por exemplo, questiona-se o porquê de
ela ter sido alçada à condição de candidata à Presidência em 2010. O debate
gira em torno das conveniências pessoais e políticas do então presidente Lula
e, especialmente, da forma como sua vontade se sobrepôs no ambiente interno do
PT.
Nesse
contexto, a questão mais importante diz respeito ao sistema partidário brasileiro,
que usualmente funciona a partir de decisões tomadas a portas fechadas e que
envolvem apenas um grupo reduzido de lideranças. Na busca por alternativas, o
modelo norte-americano tem despertado grande atenção: nos EUA, a escolha dos
candidatos pelos principais partidos é feita, em grande parte, pela própria
população, em um processo de eleições primárias. A disputa ora em curso está
próxima de um final surpreendente: o Partido Republicano, que iniciou o
processo com o número recorde de 16 pré-candidatos, agora tem apenas um na
disputa, justamente o que mais desagrada às lideranças partidárias.
Figuras
alinhadas ao perfil tradicional dos republicanos, como Jeb Bush, filho e irmão
de ex-presidentes, foram sumamente descartados pelos filiados do partido de todo
o país, em favor do histriônico e populista Donald Trump, novato tanto na
política quanto no partido. O contraste com o panorama brasileiro é extremo,
uma vez que por aqui, seria praticamente inconcebível a escolha de um candidato
que não agradasse a maioria dos líderes partidários. A impressão, em análise
superficial, é mesmo de que o sistema norte-americano é tanto mais democrático
quanto desejável, já que permite a expressão fiel da vontade popular.
Entretanto,
é necessária uma análise mais profunda: o sistema norte-americano de primárias,
apesar de mais participativo, deixa aberta a possibilidade de que as artimanhas
usuais das campanhas eleitorais sejam utilizadas também no contexto
pré-eleitoral, produzindo manipulações da vontade coletiva. O caso de Trump é
exemplar, uma vez que, mesmo mobilizando as massas populares pelo uso criativo
da mídia, é certo que está seguindo para as urnas um nome que muitos líderes do
Partido Republicano consideram inapropriado para conduzir a nação mais poderosa
do planeta. A instância partidária, que superficialmente poderia ser vista como
um intermediário à vontade popular, deixou nesse caso de cumprir seu papel
democrático fundamental: o de atuar como ambiente de discussão política
equilibrada, ampliando a perspectiva das vozes, muitas vezes conturbadas, que vêm
das ruas.
Portanto,
assim como no caso brasileiro, o sistema eleitoral norte-americano deixa aberta
a possibilidade de que uma alternativa extrema prevaleça, conturbando a escolha
do eleitor. Nos EUA de 2016, a participação popular suplantou o partido, levando
à escolha de um radical; no Brasil de 2010, a direção do partido suplantou a
participação dos filiados, possibilitando a seleção de uma candidata alheia ao
meio político.
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