terça-feira, 14 de junho de 2016

A sutil vingança de Collor e a volta de Dilma

por Paulo Diniz
(publicado na edição de 22/05/2016 de O Tempo - Belo Horizonte, Minas Gerais)

O afastamento da presidente Dilma Rousseff gerou um turbilhão de fatos que estarão presentes certamente nos livros de história. Merece destaque a sutil vingança do senador Fernando Collor, que usou a narrativa petista de “golpe de Estado” contra Dilma para indicar que o impeachment por ele sofrido em 1992 foi muito mais simplificado e apressado; sob essa lógica, portanto, teria ele também sofrido um “golpe”. Arrematando seu discurso, Collor afirmou que “a história havia lhe reservado” tal oportunidade, de votar pelo impeachment, lembrando ao PT que a vítima de 1992 agora era algoz.
A transição de governo ocupa agora jornalistas e analistas políticos. Porém, o que deve ser mantido em destaque é que o cenário político atual é essencialmente provisório. Não apenas porque o processo de impeachment apenas foi iniciado formalmente, e que há chances reais de que Dilma se defenda com sucesso das acusações, mas principalmente porque a sustentação política de Michel Temer será difícil de ser obtida. A crise econômica permanece, e as reformas necessárias para debelá-la são muito impopulares.
No campo político, assim como as votações na Câmara e no Senado reproduziram o desgaste da ex-presidente, também o atual mandatário pode se indispor facilmente com a opinião pública e com o Parlamento, dificultando a obtenção dos votos necessários para sua permanência no poder.
Para salvar os dois anos finais de mandato presidencial, Dilma Rousseff deveria, portanto, explorar as muitas fragilidades que o governo Temer certamente apresentará. Para guiar sua oposição durante os 180 dias de afastamento forçado, basta que Dilma cobre de seu sucessor exatamente aquilo que lhe foi pedido durante os dois últimos anos. Com segurança, portanto, Dilma já pode dispersar sua tropa pessoal de agitadores, atualmente ocupada em ações performáticas e queima de pneus: não passa por aí a reconquista da opinião pública e, como consequência, a retomada de seu mandato.
A simplicidade desse esquema de ação, entretanto, é ilusória. Isso porque, para que um eventual fracasso gerencial de Temer se transforme na volta do PT ao poder, é preciso que Dilma faça aquilo que ela nunca considerou necessário ou importante: política. Arrebanhar parlamentares descontentes, negociar posições conjuntas, dividir poder de decisão, aceitar opiniões, objetivos e interesses divergentes: essas ações implicam em conciliar e transigir, verbos que, a julgar pelo passado recente, são incompatíveis com a maneira como Dilma vê o papel próprio de quem ocupa o comando da nação.
A questão principal, portanto, é: será que Dilma mudará seu conceito sobre a política nos 180 dias de afastamento compulsório do poder? Sua volta à Presidência da República depende mais de suas próprias ações do que de fatores externos, como a paranoica tese do “golpe de Estado” veiculada pelo PT. Porém, exatamente por depender da própria Dilma, é que se pode apostar com certo grau de segurança que o mandato interino de Temer logo se tornará definitivo.

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