terça-feira, 14 de junho de 2016

O Gabinete Temer: interino ou transitório?

por Paulo Diniz
(publicado na edição de 24/04/2016 de O Tempo - Belo Horizonte, Minas Gerais)

A admissão do processo de impeachment contra Dilma Rousseff pela Câmara dos Deputados não representa surpresa para quem acompanha as nuances da política brasileira. Vários episódios construíram, ao longo dos últimos dois anos, a votação de 17 de abril, dentre eles: o rompimento da bancada evangélica com o PT, motivado pela divulgação de comentários preconceituosos feitos por Lula em 2015; o atraso constante no pagamento das emendas parlamentares por parte do Planalto; a incapacidade em gerenciar a complexa relação com o PMDB, que acabou gerando uma rara unidade do partido, dentre outros eventos menores.
Hoje, é quase consenso a análise de que o Senado admitirá o processo de impeachment: vários os membros dessa Casa já sinalizaram o desejo de não se indispor com a Câmara, cuja decisão foi impactante sobre a sociedade. Não ocorrendo imprevisto, é uma questão de tempo até que o governo interino de Michel Temer tenha início, o que acontecerá sob as piores condições possíveis: além dos problemas econômicos e administrativos herdados de Dilma, o próximo presidente terá que lidar com um alto grau de expectativas, proporcional à rejeição quase unânime que impulsionou o processo de impeachment.
No mesmo sentido, os 367 votos favoráveis ao afastamento de Dilma estão longe de representar uma base parlamentar de apoio ao PMDB. Trata-se, afinal, de um grupo heterogêneo, cujo único ponto em comum é a rejeição a Dilma Rousseff. A favor de Temer, nesse aspecto, conta apenas a nítida consciência que esse demonstra ter a respeito da necessidade crucial de construção de consenso com todas as correntes políticas.
Para a composição da equipe de governo, a velha dicotomia entre escolhas de caráter político ou técnico estará mais viva do que nunca para o sucessor de Dilma: ao mesmo tempo, estarão presentes demandas políticas vorazes por cargos no Governo Federal, assim como a necessidade de se produzir melhorias imediatas na vida da população. Normalmente, a nomeação de políticos não melhora o funcionamento do Estado, assim como a nomeação de técnicos não costuma produzir apoio político ao governante. Dosar com precisão os perfis selecionados para o gabinete de Temer, deixando a todos satisfeitos, é tarefa muito difícil, e com certeza causará os primeiros grandes atritos do governo interino.
Considerando a gravidade e dificuldade dos desafios postos a Michel Temer, é preciso então ver com outros olhos o governo interino que ele comandará a partir da admissão do impeachment por maioria simples do Senado. Caso não consiga gerar mudanças perceptíveis na vida da maioria da população, que apoia a retirada de Dilma do poder, o mandato do presidente interino corre o sério risco de se resumir aos 180 dias regulamentares, ao longo dos quais transcorrerão as etapas de investigação e julgamento do impeachment. As forças populares e políticas mobilizadas por Temer podem se voltar contra ele com grande rapidez, se ganhar corpo a sensação de que a mudança no comando do país foi em vão.

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