por Paulo Diniz
(publicado na edição de 24/04/2016 de O Tempo - Belo Horizonte, Minas Gerais)
A
admissão do processo de impeachment contra Dilma Rousseff pela Câmara dos
Deputados não representa surpresa para quem acompanha as nuances da política
brasileira. Vários episódios construíram, ao longo dos últimos dois anos, a
votação de 17 de abril, dentre eles: o rompimento da bancada evangélica com o
PT, motivado pela divulgação de comentários preconceituosos feitos por Lula em
2015; o atraso constante no pagamento das emendas parlamentares por parte do
Planalto; a incapacidade em gerenciar a complexa relação com o PMDB, que acabou
gerando uma rara unidade do partido, dentre outros eventos menores.
Hoje,
é quase consenso a análise de que o Senado admitirá o processo de impeachment:
vários os membros dessa Casa já sinalizaram o desejo de não se indispor com a
Câmara, cuja decisão foi impactante sobre a sociedade. Não ocorrendo imprevisto,
é uma questão de tempo até que o governo interino de Michel Temer tenha início,
o que acontecerá sob as piores condições possíveis: além dos problemas
econômicos e administrativos herdados de Dilma, o próximo presidente terá que
lidar com um alto grau de expectativas, proporcional à rejeição quase unânime
que impulsionou o processo de impeachment.
No
mesmo sentido, os 367 votos favoráveis ao afastamento de Dilma estão longe de
representar uma base parlamentar de apoio ao PMDB. Trata-se, afinal, de um
grupo heterogêneo, cujo único ponto em comum é a rejeição a Dilma Rousseff. A
favor de Temer, nesse aspecto, conta apenas a nítida consciência que esse demonstra
ter a respeito da necessidade crucial de construção de consenso com todas as
correntes políticas.
Para
a composição da equipe de governo, a velha dicotomia entre escolhas de caráter
político ou técnico estará mais viva do que nunca para o sucessor de Dilma: ao
mesmo tempo, estarão presentes demandas políticas vorazes por cargos no Governo
Federal, assim como a necessidade de se produzir melhorias imediatas na vida da
população. Normalmente, a nomeação de políticos não melhora o funcionamento do
Estado, assim como a nomeação de técnicos não costuma produzir apoio político
ao governante. Dosar com precisão os perfis selecionados para o gabinete de
Temer, deixando a todos satisfeitos, é tarefa muito difícil, e com certeza
causará os primeiros grandes atritos do governo interino.
Considerando
a gravidade e dificuldade dos desafios postos a Michel Temer, é preciso então ver
com outros olhos o governo interino que ele comandará a partir da admissão do
impeachment por maioria simples do Senado. Caso não consiga gerar mudanças
perceptíveis na vida da maioria da população, que apoia a retirada de Dilma do
poder, o mandato do presidente interino corre o sério risco de se resumir aos
180 dias regulamentares, ao longo dos quais transcorrerão as etapas de
investigação e julgamento do impeachment. As forças populares e políticas
mobilizadas por Temer podem se voltar contra ele com grande rapidez, se ganhar
corpo a sensação de que a mudança no comando do país foi em vão.
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