segunda-feira, 1 de junho de 2015

Os novos reacionários

por Paulo Diniz
(publicado na edição de 31/05/2015 de O Tempo - Belo Horizonte, Minas Gerais)

O momento político atual do Brasil, como mostra o noticiário diário, destoa da estabilidade que costuma marcar o panorama nacional. Além do choque de forças políticas, podemos ver agora mudanças na forma como a sociedade lida com os acontecimentos do mundo do poder.
A campanha eleitoral de 2014, intensamente debatida nas redes sociais, foi assumida por boa parte dos brasileiros como questão pessoal, sendo inúmeros os casos nos quais relacionamentos pessoais foram afetados por discussões de cunho político. Esse envolvimento popular na política pode ser associado às manifestações populares antigoverno do início de 2015: do panelaço aos protestos de rua de março e abril, trata-se de um novo público que se envolve com a ação política direta, composto principalmente pelas famílias de classe média. Dessa forma, a diversificação da participação política passa a refletir melhor os diferentes grupos que compõem a sociedade brasileira.
Nesse contexto, chama a atenção um movimento de reação que visa desacreditar a atuação política da classe média, geralmente veiculado por atores formais do sistema político e pelas redes sociais. Assim, por se tratar de grupos que reagem a uma nova pressão social, com o objetivo de manter a situação vigente, podem então ser classificados como “reacionários”; mesmo sendo esses, em sua maioria, filiados à esquerda governista, autodenominada progressista.
O argumento principal dos novos reacionários é o de que a legitimidade para a participação em manifestações políticas é variável, de acordo com o grupo social: carências sociais básicas habilitam quem as sofre a reivindicar ao Estado publicamente; já a população que não se encontra em estado de indigência, por definição, é menos legítima para colocar a público suas queixas. Essa lógica, além de supor uma situação de emergência administrativa constante, que apenas permitiria ao Estado atender às demandas sociais mais extremas, também solapa um dos princípios mais importantes da democracia: a igualdade, que deve permitir a todos a expressão de seus pontos de vista e o acesso uniforme à arena política.
Há também um componente estrutural em jogo: durante as últimas décadas, coube à esquerda o papel principal na realização de manifestações de rua no Brasil, constituindo um monopólio que hoje é cada vez mais contestado. Tanto em 2013 quanto em 2015, as multidões que tomaram as ruas fugiam completamente do estereótipo do militante partidário: jovem e continuamente mobilizado, além de cada vez mais ligado a cargos na burocracia federal das administrações petistas.

Ao classificar seus antagonistas como burgueses e “coxinhas”, os novos reacionários realizam a mais baixa forma de jogo partidário: buscam impedir a entrada de opositores no cenário político, diminuindo de forma antidemocrática a oposição ao partido que ocupa o poder. Com isso, afinal, lutam principalmente para garantir seu lugar ao sol: tanto como porta-vozes do conjunto da sociedade, quanto como beneficiários dos favores do poder.

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