(publicado na edição de 07/06/2015 de O Tempo - Belo Horizonte, Minas Gerais)
O
recente episódio no qual o ex-presidente Lula fez comentários desrespeitosos a
pastores evangélicos, por mais que se assemelhe com uma gafe a mais no longo
histórico do líder petista, na verdade é pleno de significado. Adepto da
informalidade em suas falas, Lula chegou a dizer, em viagem oficial à Namíbia,
que a limpeza e organização desse país eram tamanhas que não parecia se tratar
de uma nação africana. A diferença, agora, é que o tropeço de Lula não pode
mais ser creditado à conta do pitoresco e folclórico: acreditando ser seu
partido vítima de uma injustificada campanha de ódio, o ex-presidente revida
com postura agressiva, típica do início de sua carreira política. Acaba por
agredir, assim, não apenas o respeito à diversidade religiosa, mas
principalmente a estrutura política e social que permitiu a vitória petista de
2002.
Indignado,
o senador capixaba Magno Malta divulgou vídeo em resposta aos comentários
jocosos do ex-presidente: o parlamentar lembrou seu esforço pessoal para romper
as ressalvas que o eleitorado evangélico tinha em relação a Lula antes de 2002,
dizendo-se amargamente arrependido hoje. No mesmo sentido, o popular pastor
Silas Malafaia trouxe à tona os escândalos de corrupção que envolveram as
gestões federais petistas. Percebe-se, assim, que o PT perde o apoio de um
importante grupo social que contribuiu para a histórica ascensão de Lula ao
poder.
Outra
engrenagem comprometida na estrutura de apoio ao PT é o PMDB: de aliado
decisivo para a chegada e manutenção do poder, o maior partido do país passou
recentemente ao posto de líder da coalizão governista. Comandando ambas as
casas do Legislativo federal, o PMDB não só impõe uma agenda própria sobre o
governo, como também dá sustentação a boatos cada vez mais consistentes sobre o
lançamento de candidatura própria à Presidência da República em 2018.
A
crise econômica e o ajuste fiscal, por sua vez, completam o cenário de mudança.
No passado recente, o aquecimento geral da economia e a situação de pleno
emprego da mão de obra nacional, somados às medidas de estímulo ao consumo
adotadas pelo governo, contribuíram para criar um clima de otimismo na
população, astutamente reivindicado pela administração petista como seu mérito
único e exclusivo. Agora, a maré contrária na economia leva o povo a creditar
ao governo até mesmo os reveses nos quais esse não tem culpa ou participação;
essa dinâmica, inclusive, motivou um dos polêmicos comentários de Lula em
relação aos evangélicos. Fica a dúvida, afinal, se o tradicional jeito petista
de governar pode ser praticado também em um contexto de restrição de gastos, ou
se apenas é viável em tempos de bonança.
Considerando
a complexidade dos novos desafios que se colocam diante do PT, assim como o
tempo gasto nas décadas de 80 e 90 para superar tais dilemas, é possível afirmar
que o partido do governo deverá encontrar enormes dificuldades para se manter
no poder: não só na sucessão presidencial de 2018, mas principalmente, no
intervalo até lá.
Nenhum comentário:
Postar um comentário