domingo, 22 de fevereiro de 2015

Impeachment: uma palavra no ar

por Paulo Diniz
(publicado na edição de 22/02/2015 de O Tempo - Belo Horizonte, Mina Gerais - e de 19/02/2015 do Jornal de Uberaba - Uberaba, Minas Gerais)

Chama a atenção, no noticiário político atual, a rapidez com a qual a ideia do impeachment de Dilma Rousseff se disseminou e ganhou força. Mesmo tendo vencido por diferença mínima o pleito de outubro passado, ainda assim a presidente constituiu maioria nas urnas, o que torna o quadro atual enigmático pela rapidez com a qual se desenvolveu.
Para compreender esse fenômeno, é importante lembrar quão inflamada foi a campanha de 2014: os ataques produzidos pela equipe do PT marcaram época pela agressividade. Essa estratégia, apesar de vencedora, dificulta a conciliação posterior entre as diferentes correntes políticas e sociais que compõem o país. Mais do que isso, o acirramento dos ânimos elevou as apostas colocadas no jogo eleitoral: cada promessa ganhou muito mais peso, pois tinha a função de separar o bem do mal. Agora que a tão prevista crise econômica mostra seus primeiros sinais, Dilma sofre um desgaste popular diferente do que atingiu seus antecessores recentes: nenhum precisou prometer tanto, com tanta intensidade, para vencer as eleições. As medidas impopulares de ajuste econômico geraram antipatia imediata em relação a Dilma. Assim, as pesquisas que mostram rejeição da maioria da população ao novo governo são terreno político fértil para o processo de impedimento da presidente.
É bom mencionar, também, que a articulação política do novo governo tem gerado mais descontentamento do que apoio. O PMDB foi alheado de ministérios de grande orçamento, acusando muita insatisfação. Esse sentimento, não apaziguado, foi também importante para conduzir Eduardo Cunha à Presidência da Câmara dos Deputados, um notório desafeto de Dilma e membro do PMDB. Considerando a forma como esse partido tem mandado recados cada vez mais contundentes ao governo petista, é justo supor que a temática do impeachment tem mesmo origem nas fileiras descontentes do PMDB, o aliado que tem se mostrado ser o pior inimigo que se pode ter.
É preciso considerar, entretanto, que o cumprimento de uma agenda de impeachment demandaria do PMDB a coesão que tanto falta ao partido. Assumir o primeiro plano do Poder Executivo é algo que tem sido evitado desde 1994, último pleito no qual lançou candidato próprio ao comando do país. Um eventual governo de Michel Temer significaria uma mudança radical na vitoriosa estratégia do partido, principal aliado de todos os presidentes das últimas duas décadas. O risco envolvido nessa reviravolta política apenas seria aceitável ao PMDB em caso de grave comoção popular, servindo o partido de veículo das aspirações populares.
A oposição formal ao governo petista, inerte quanto ao tema do impeachment, tem sido acusada de liderar esse movimento pelos próceres do PT, o que demonstra incrível incapacidade de percepção do que ocorre nos bastidores da base governista. O retorno de Lula à articulação política do governo, pelo hábito do ex-presidente em lidar com as demandas do PMDB, deve ser capaz de corrigir esse tipo de falha, estabilizando o novo mandato de Dilma.

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