segunda-feira, 16 de fevereiro de 2015

Orçamento impositivo e a terceira via

por Paulo Diniz
(publicado na edição de 15/02/2015 de O Tempo - Belo Horizonte, Minas Gerais)

O recente anúncio de que PPS, PSB, PV e Solidariedade pretendem constituir uma federação partidária, politicamente não alinhada com governo ou oposição, foi notícia que gerou pouca repercussão. Mesmo sendo claro o objetivo de fortalecimento político desses partidos, é importante notar que essa nova configuração pode ser também resultado de uma mudança institucional de vulto, e que portanto, merece análise.
O fator conjuntural que contribui para o presente cenário é a saturação da base governista federal: dado o gigantismo do PMDB como parceiro maior da gestão petista, ocupando grande quantidade de espaços na máquina pública, é cada vez mais difícil que um partido receba recompensas adicionais pela fidelidade à plataforma de Dilma. O rompimento do PSB com o governo, em 2013, foi resultado desse engessamento da estrutura de apoio governista. Trata-se de um risco, do ponto de vista eleitoral, porém que vários estão agora dispostos a correr.
Outro fator, esse de corte institucional, contribui também para a configuração desse quadro partidário mais complexo. Trata-se do chamado “orçamento impositivo”, regra que está prestes a ser aprovada pela Câmara dos Deputados em versão final, e que pretende obrigar o Governo Federal a executar os trechos do orçamento federal elaborados diretamente por cada deputado: as emendas parlamentares. Via de regra, cada deputado elabora emendas sobre o projeto de lei orçamentária apresentado pelo Executivo, que buscam destinar recursos às suas bases eleitorais, recompensando a votação recebida. Ocorre que, frequentemente, o governo federal condiciona de forma sutil a liberação de tais recursos a algum tipo de apoio político em especial. Basta ver que a aprovação da redução do limite de superávit primário do Governo Federal em 2014, contra a Lei de Responsabilidade Fiscal, foi obtida a partir da liberação de R$ 444 milhões para pagamento de emendas parlamentares.
A aprovação do orçamento impositivo concede liberdade ao parlamentar: livra-o do risco de não ter suas emendas pagas e, assim, deixar seus eleitores desassistidos até das promessas da campanha. Nesse contexto, aderir à oposição ou tornar-se independente não colocaria em risco direto a reeleição do senador ou deputado, daí a diminuição do medo em abandonar as asas protetoras do governo da vez. Sem sombra de dúvida, trata-se de uma grande evolução para o Legislativo no Brasil, e um avanço da democracia, como a atual pluralização de correntes políticas nos deixa ver.
Como alguns elementos levam a uma mudança definitiva na estrutura da política brasileira, e outros apontam para uma fase apenas transitória, é impossível definir qual terá mais peso com o tempo. Porém, é possível acreditar que estamos diante de uma chance de evolução no funcionamento da democracia do Brasil. Mais do que os malabarismos institucionais propostos na reforma política, é através de medidas como o orçamento impositivo que se pode tornar o Parlamento mais independente, e por isso, mais representativo.

Nenhum comentário:

Postar um comentário