terça-feira, 25 de março de 2014

Autoritarismo pop

por Paulo Diniz
(publicado nas edições de 25/03/2014 de O Tempo - Belo Horizonte, Minas Gerais - e de 30/03/2014 do Diário de Caratinga - Caratinga, Minas Gerais - e de 05/04/2014 do Bocaiúva em Notícias - Bocaiúva, Minas Gerais)

Com o final do mês de março, aproxima-se o cinquentenário do golpe de 1964, que deverá ser lembrado com ênfase apoteótica, considerando as eleições de outubro. Como a candidata Dilma Rousseff se engajou militarmente contra o regime ditatorial, espera-se que os estrategistas de sua campanha busquem capitalizar sobre a data histórica, destacando o passado de luta da presidente. Porém, é preciso alertar para a integridade dos fatos que serão abordados, assim como para as perigosas implicações da manipulação de ideias políticas extremistas, próprias dos anos 1960, no contexto político brasileiro atual.
É oportuno destacar que, qualquer pessoa que coloca em segundo plano sua integridade pessoal e perspectivas futuras em favor de objetivos coletivos merece, no mínimo, respeito. Entretanto, os ideais defendidos por Dilma eram tão nocivos quanto os do regime que ela combateu. Inspirados pelo totalitarismo de esquerda e financiados por alguns dos governos mais cruéis do século XX, os movimentos de luta armada buscavam tomar o poder dos militares à força e, alterando a ideologia vigente, manter o Brasil sob ditadura. Malabarismos semânticos e filosóficos buscam, até hoje, camuflar o autoritarismo do socialismo que se queria implantar no Brasil; porém nada ilustra melhor esse raciocínio do que a frase de Millôr Fernandes: "Democracia é quando eu mando em você; ditadura é quando você manda em mim".
Quanto à associação de idéias que busca retratar Dilma como ícone da luta pela democracia, não é só o rigor dos fatos históricos que está em jogo. O risco que corremos é o de referendar ideais antidemocráticos, algo perigoso em um país como o Brasil, de pouca participação e cultura políticas. O relatório anual “Latinobarômetro”, realizado em 18 países, indicou em 2013 que a maioria dos brasileiros não valoriza a democracia: 51% de nossa população não se importa com a vigência do regime democrático. O que predomina, no contexto nacional, é a preocupação com interesses pessoais e familiares, deixando a esfera pública a cargo do Estado. 
Quando uma população se orienta por valores individualistas, torna-se campo fértil para doutrinas totalitárias. Afinal, independente da matriz ideológica, essas sempre prometem o bem-estar pessoal ao cidadão, desde que esse abra mão de sua liberdade política; nessa “transação”, poucos consideram que a opressão pode vir a lhes vitimar. Já a democracia, é sempre menos atraente aos individualistas: oferece uma fórmula de convívio e negociação entre os vários grupos da sociedade, o que leva a resultados bons para todos, porém ótimos para ninguém. O preço do consenso é saber ceder, o que afasta a democracia das soluções imediatistas e absolutas, apresentadas pelas ditaduras de esquerda e direita.
É sempre bom lembrar que, mesmo que o convívio e a negociação democráticos não sejam populares no Brasil, foram essas as armas que, empunhadas pela oposição civil, levaram à derrocada da ditadura. Venceram a luta, sem armas, os que defendiam a liberdade.


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