por Paulo Diniz
(publicado na edição de 06/03/2014 do Jornal de Uberaba - Uberaba, Minas Gerais)
A recente
visita da presidente Dilma Rousseff a Cuba, marcada pela inauguração de obras e
anúncio de novas verbas brasileiras para a ilha, serviu como prévia de outra
polêmica: a deserção de médicos cubanos no Brasil, trazidos no âmbito do
programa “Mais Médicos”. Em discurso diante do governo cubano, no poder desde
1959, Dilma agradeceu o envio dos profissionais que já estão no Brasil, e
acentuou a possibilidade de ampliação do programa para a inclusão de mais alguns
milhares de médicos.
O debate em
torno dessa iniciativa tem sido acirrado, com a politização marcante do tema.
Argumentos técnicos têm sido manobrados pela dicotomia “governo contra
oposição”, o que leva a discussão a girar em torno do apoio do governo petista
à ditadura cubana ou, em contraposição, ao alegado descompromisso dos partidos
de oposição em relação à população mais carente. Em qualquer dos cenários, o
ponto principal do debate é deixado de lado, em favor do enfrentamento estéril
direcionado para as eleições de outubro.
Desde 1889 o
Brasil se organiza como federação, porém em nenhum momento de sua história
democrática o país apresentou tamanha concentração de poder e recursos em sua
esfera central de governo. Responsável pela maioria dos impostos cobrados, a
União reteve, em 2012, 57% de todos os recursos públicos, enquanto 27 estados ficaram
com 25% do total, e 5.570 municípios dividiram entre si os 18% restantes. Esses
números são inversamente proporcionais à oferta de serviços que cada ente
federado disponibiliza à população.
A área da
saúde se destaca, nesse contexto de desequilíbrio: os municípios são os maiores
responsáveis pela oferta de serviços aos cidadãos, enquanto os estados devem
realizar o investimento estrutural na saúde pública, integrando novos
equipamentos e estruturas à rede de atendimento. Assim, os que têm menor acesso
aos recursos públicos estão encarregados das funções centrais da saúde pública
brasileira, custeando 54% do gasto em saúde realizado no país em 2012. A União,
responsável por financiar as despesas correntes desse sistema, o faz através de
repasses automáticos, marcados por valores historicamente defasados. O dilema
da saúde pública brasileira, assim, é uma questão de cunho federativo: os
recursos e as tarefas a serem realizadas não se encontram em equilíbrio.
O programa
“Mais Médicos” evidencia e agudiza a desigualdade da federação brasileira, pois
ao mesmo tempo que o Governo Federal se nega a distribuir uma fatia maior de
recursos aos estados e municípios, utiliza esses valores por conta própria,
financiando um programa elaborado unilateralmente. A proximidade do contexto
eleitoral deve ser considerada, pois explica a ação não-cooperativa do governo
de Dilma Rousseff: ao invés de distribuir riqueza, permitindo um melhor
funcionamento do SUS pela potencialização da ação de estados e municípios, faz
com que a União absorva todos os méritos, financiando uma iniciativa dissonante
dos quase 30 anos de planejamento que marcam a evolução do SUS.
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