(publicado na edição de 05/04/2012 do Tempo - Belo Horizonte, Minas Gerais - e na edição de 14/03/2012 do Correio do Sul - Varginha, Minas Gerais)
Uma estranha
combinação de idéias toma conta das pessoas quando o assunto é a disputa entre
Reino Unido e Argentina pelas ilhas Malvinas, que volta à tona por ocasião dos
30 anos do conflito militar entre esses países. Nós, brasileiros, temos a
tendência a nos solidarizar imediatamente com nossos vizinhos, por motivos de
proximidade cultural, geográfica e econômica, mas principalmente, devido ao
fato de o opositor ser uma nação tradicionalmente poderosa, símbolo de uma
opressão passada.
Há,
entretanto, argumentos mais profundos envolvidos, que nos afastam da atmosfera
passional que envolve o assunto. Em 1982, a Argentina viva sob uma das ditaduras
mais brutais do passado recente, responsável pela morte de cerca de 30 mil pessoas
em oito anos. Em busca de popularidade, os militares que governavam o país
decidiram pela invasão das ilhas, atiçando os brios nacionalistas da população.
O Reino Unido, por sua vez, vivia há séculos a plenitude da democracia, sendo
responsável pela criação de várias instituições e liberdades que hoje são tidas
por fundamentais. Não há sentimentalismo panamericano que resista a essa
consideração simples. Há mocinhos e bandidos nessa história, sim, mas os papéis
são diametralmente opostos em relação ao que a maioria dos brasileiros
acredita.
A rápida
vitória britânica em 1982 expôs não só a fragilidade militar argentina, mas
também trouxe a público a fantasia nacionalista que havia sido criada: em pouco
tempo, caía a ditadura e tinha início a transição democrática. O tema da
“reconquista” das Malvinas perdeu importância, sendo substituído pela
aproximação política e econômica com Brasil, Paraguai e Uruguai, que conduziu à
criação do Mercosul. Em tempos de paz e democracia, construiu-se uma agenda
voltada para o desenvolvimento.
Hoje, tristes
coincidências parecem acontecer. Diante de baixos índices de popularidade e de
persistente crise econômica, a presidente Cristina Kirchner volta suas energias
para as Malvinas, com uma série de declarações nacionalistas. A mesma Cristina
que ameaça cancelar linhas aéreas e navios de carga da Argentina para as ilhas,
também busca de várias formas encerrar as atividades do maior jornal do país,
que faz oposição a seu governo. Não há espaço, assim, para a bizantina
controvérsia histórico-jurídica sobre a quem cabe a posse das Malvinas; a
questão é superficial, pois trata de um governo fazendo uso de tema – de amplo
apelo emocional – com o intuito de ganhar popularidade.
O Brasil, no
mesmo ano de 1982, já multipartidário e com a
imprensa livre, se preparava para eleger diretamente seus governadores,
reconstruindo rapidamente sua democracia; nas últimas três décadas, o país se
manteve fiel em seu compromisso democrático, consolidando e aprofundando
direitos. Amante da paz e da liberdade, o brasileiro deve saber identificar
quem mais compartilha de seus ideais, para marcar posição a seu lado,
independentemente da origem histórica, étnica ou econômica desse parceiro.
Demonstrando esse tipo de maturidade democrática, ajudamos a construir a
estabilidade de nosso continente.
Excelente artigo! Parabéns Obs! Dani
ResponderExcluirUma ótima perspectiva que leva o leitor a considerar racionalmente sua percepção subjetiva sobre a disputa e os seus atores. Gostei de ver.
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