sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

As Várias europas e seus problemas

por Paulo Diniz
(publicado na edição de 24/02/2012 do Correio do Sul - Varginha, Minas Gerais - e na edição de 25/02/2012 do Jornal de Uberaba - Uberaba, Minas Gerais)

O recrudescimento da crise na Grécia – evidenciado por protestos populares e pela redução da economia em 7% em 2011 – deixa claro que não se pode usar o nome Europa no singular. A existência de diferenças abissais entre os países que compõem a União Européia – sempre existente, mas camuflada durante a última década por uma certa “euro-euforia” – obriga a uma reflexão detida sobre o nítido retrocesso da integração do continente europeu.
Antes de mais, a posição ocupada hoje por Alemanha, França e Reino Unido deve ser compreendida como fruto de posicionamentos responsáveis – tanto de governos, quanto das sociedades – não só em relação ao futuro, mas principalmente no que tange ao presente, e às dificuldades que esse muitas vezes apresenta. Os países que ocupam as posições “centrais” no contexto europeu enfrentaram desafios os mais diversos durante as últimas décadas, sem com isso lançarem mão de gastos desproporcionais em relação às suas riquezas; hoje, contraditoriamente, financiam os desequilíbrios fiscais alheios.
O déficit das contas públicas gregas, portuguesas e espanholas não é assunto recente, tendo sido profundamente debatido dez anos atrás, quando da implantação do Euro como moeda comum dos países da EU. A essas nações periféricas foi dada a oportunidade de participar do grupo de adotantes da nova moeda, porém mediante o compromisso de mudança no padrão de gastos governamentais; foram estabelecidos prazos e cronogramas diversos, para que se pudesse atingir, de maneira gradual, a velha máxima de “gastar apenas aquilo que se tem” (ou, chegar o mais próximo possível disso). Tudo em vão, pois a última década foi marcada apenas pelo grande afluxo de investimentos – privados e públicos – para as nações periféricas da União Européia, que se preocuparam somente em usufruir de tal momento favorável.
Pode-se argumentar a respeito da complexidade de tal mudança de padrão de gastos governamentais, que envolveria a adoção de uma nova relação entre o Estado e a sociedade. Porém, data também do princípio da década de 2000 o início da vigência no Brasil da Lei de Responsabilidade Fiscal, que tinha o mesmo objetivo daquele exigido de Grécia, Portugal e Espanha, ou seja, o equilíbrio entre arrecadação e gastos governamentais. Hoje, a aversão ao endividamento faz parte da cultura administrativa brasileira, sendo recitada de cor até pelos servidores dos mais humildes municípios brasileiros. Teria sido essa, então, uma missão impossível para gregos, portugueses e afins?
A história recente da integração européia deixa clara, desde já, uma lição: não existe mecanismo para o desenvolvimento econômico que dispense o compromisso com diretrizes de atuação política responsáveis; em outras palavras, não há como superar um atraso secular sem um alto grau de comprometimento e trabalho árduo. Assim ocorreu com Alemanha e França, que hoje financiam a bancarrota alheia por apreço que têm à integração política do continente como um todo; porém, para qualquer resultado que esses busquem atingir, a conta a ser paga já está ficando muito cara.

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