(publicado na edição de 10/02/2012 de O Tempo - Belo Horizonte, Minas Gerais - e de 07/02/2012 do Correio do Sul - Varginha, Minas Gerais)
O governo da
presidente argentina Cristina Kirchner deve colocar em prática, no mês que se
inicia, uma série de medidas com o intuito de dificultar a entrada de produtos
estrangeiros em seu país. Considerando a proximidade geográfica e o grande
volume de comércio, fica claro que o alvo de Cristina é o Brasil, o que deixa
no ar uma pergunta: que sentido há, para uma nação que atravessou uma década de
crise sem precedentes, em se afastar da sexta maior economia do mundo?
Não é
necessário enveredar pelas bizantinas discussões dos economistas – com suas
comparações entre modelos de desenvolvimento e séries históricas – para se
concluir que a história recente da Argentina gira em torno de escolhas, e das
oportunidades que essas viabilizaram – ou impediram. A transição da década de
80 para a de 90 trouxe ao país a estabilização econômica antes que essa
ocorresse no Brasil; do mesmo período data também a opção pela integração ao
Brasil, que gerou o Mercosul. A aproximação entre as economias dos dois países
colocou em contato seus setores produtivos, levando empresários a desenvolverem
estratégias de integração dinâmicas e modernas: concentrados nos pontos fortes
de cada país, criaram bases de competitividade de padrão mundial em vários
setores.
Entretanto, no
que se refere às posições de governo, as escolhas argentinas não seguiram por
esse caminho: enquanto o Brasil realizou reformas politicamente indigestas na
área do controle de gastos e da regulação do sistema bancário, nossos vizinhos
passaram ao largo de tais questões, optando por sorver os benefícios –
sobretudo políticos – da bonança da década de 90. Quando a crise dos anos 2000
se abateu sobre o continente, o Brasil manteve seus objetivos fiscais e
expandiu exponencialmente seus programas de transferência de renda às camadas
mais carentes da população, o que fortaleceu em muito o mercado consumidor
interno. Por sua vez, a Argentina escolheu fazer uso de um arsenal de medidas
de curto prazo – como tabelamentos de preços, confiscos bancários e até a
fabricação de índices fictícios de inflação – que não têm produzido resultados
concretos, mas que geram ganhos políticos imediatos aos seus líderes.
Agora nossos
vizinhos têm mais uma oportunidade: retomar a integração com o Brasil – hoje um
dos pólos de dinamismo da economia mundial –, e assim alavancar a recuperação
econômica a partir de uma relação política acessível e próxima. O grande
potencial agropecuário dos dois países, aliado ao bom momento desses produtos
no mercado mundial, estimula ainda mais a parceria. Essa aproximação,
entretanto, parece não ser a opção de Cristina Kirchner, que se volta para a
defesa da arcaica indústria dos – populosos – arredores de Buenos Aires,
enquanto sobrecarrega de impostos os produtores rurais das – pouco povoadas –
províncias do interior. Enquanto o ganho eleitoral imediato – que recentemente
garantiu fácil reeleição à atual mandatária – permanecer como o principal
critério nas escolhas dos líderes argentinos, nuvens de tempestade continuarão
a pairar sobre o futuro de nossos vizinhos austrais.
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