terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

As escolhas da Argentina

por Paulo Diniz
(publicado na edição de 10/02/2012 de O Tempo - Belo Horizonte, Minas Gerais - e de 07/02/2012 do Correio do Sul - Varginha, Minas Gerais)

O governo da presidente argentina Cristina Kirchner deve colocar em prática, no mês que se inicia, uma série de medidas com o intuito de dificultar a entrada de produtos estrangeiros em seu país. Considerando a proximidade geográfica e o grande volume de comércio, fica claro que o alvo de Cristina é o Brasil, o que deixa no ar uma pergunta: que sentido há, para uma nação que atravessou uma década de crise sem precedentes, em se afastar da sexta maior economia do mundo?
Não é necessário enveredar pelas bizantinas discussões dos economistas – com suas comparações entre modelos de desenvolvimento e séries históricas – para se concluir que a história recente da Argentina gira em torno de escolhas, e das oportunidades que essas viabilizaram – ou impediram. A transição da década de 80 para a de 90 trouxe ao país a estabilização econômica antes que essa ocorresse no Brasil; do mesmo período data também a opção pela integração ao Brasil, que gerou o Mercosul. A aproximação entre as economias dos dois países colocou em contato seus setores produtivos, levando empresários a desenvolverem estratégias de integração dinâmicas e modernas: concentrados nos pontos fortes de cada país, criaram bases de competitividade de padrão mundial em vários setores.
Entretanto, no que se refere às posições de governo, as escolhas argentinas não seguiram por esse caminho: enquanto o Brasil realizou reformas politicamente indigestas na área do controle de gastos e da regulação do sistema bancário, nossos vizinhos passaram ao largo de tais questões, optando por sorver os benefícios – sobretudo políticos – da bonança da década de 90. Quando a crise dos anos 2000 se abateu sobre o continente, o Brasil manteve seus objetivos fiscais e expandiu exponencialmente seus programas de transferência de renda às camadas mais carentes da população, o que fortaleceu em muito o mercado consumidor interno. Por sua vez, a Argentina escolheu fazer uso de um arsenal de medidas de curto prazo – como tabelamentos de preços, confiscos bancários e até a fabricação de índices fictícios de inflação – que não têm produzido resultados concretos, mas que geram ganhos políticos imediatos aos seus líderes.
Agora nossos vizinhos têm mais uma oportunidade: retomar a integração com o Brasil – hoje um dos pólos de dinamismo da economia mundial –, e assim alavancar a recuperação econômica a partir de uma relação política acessível e próxima. O grande potencial agropecuário dos dois países, aliado ao bom momento desses produtos no mercado mundial, estimula ainda mais a parceria. Essa aproximação, entretanto, parece não ser a opção de Cristina Kirchner, que se volta para a defesa da arcaica indústria dos – populosos – arredores de Buenos Aires, enquanto sobrecarrega de impostos os produtores rurais das – pouco povoadas – províncias do interior. Enquanto o ganho eleitoral imediato – que recentemente garantiu fácil reeleição à atual mandatária – permanecer como o principal critério nas escolhas dos líderes argentinos, nuvens de tempestade continuarão a pairar sobre o futuro de nossos vizinhos austrais.

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