(publicado na edição de 14/08/2012 do Hoje em Dia - Belo Horizonte, Minas Gerais)
O governo do
Haiti solicitou, e foi atendido em julho, assistência formal do Brasil para
reconstruir suas forças armadas. Um pacote de medidas de apoio está sendo
negociado, a partir da condição brasileira de que os novos militares deverão
ser estritamente profissionais, desligados do turbulento cenário político
haitiano, e que possam assumir as tarefas hoje desempenhadas pelos soldados da
ONU presentes no país.
Comandante da
missão das Nações Unidas por ter contribuído com o maior contingente militar, o
Brasil não recebeu o pedido haitiano por acaso. Quando a política externa
brasileira passou a buscar horizontes mais amplos, sobretudo na década de 2000,
não só começaram a surgir compromissos de tipos distintos, como também novas
oportunidades políticas e comerciais. Interessante destacar a maturidade da
sociedade brasileira para aceitar tal cenário, principalmente em comparação com
o ano de 1999, quando houve repúdio generalizado ao envio de um grande
contingente brasileiro para a pacificação do Timor Leste.
Faz parte
também da nova postura brasileira no mundo o plano de recuperação da indústria
bélica nacional, uma série de medidas de incentivo lançada em setembro de 2011
pelo Governo Federal. Grande exportadora nas décadas de 1970 e 1980, a indústria de
armamentos brasileira chegou a figurar entre as dez maiores do mundo, abastecendo
conflitos como a Guerra Civil de Angola e a Guerra Irã-Iraque. Recuperar o
poderio militar brasileiro significa, assim, voltar ao centro do debate sobre a
responsabilidade da indústria armamentista na construção da miséria humana.
Não há dúvida
quanto ao valor humanitário do trabalho que as tropas brasileiras cumprem no
Haiti, principalmente após o terremoto de 2010, quando dobramos o número de
soldados para auxiliar as vítimas da tragédia. Também não se pode questionar os
ganhos políticos, pois o Brasil é cada vez mais visto como referência por
muitos países. Porém, é preciso que a sociedade brasileira participe do debate
acerca dos efeitos colaterais dessa nova forma de se posicionar diante do mundo,
pois corremos o risco de trocar os valores pacifistas, tão caros a nosso povo,
por ganhos econômicos limitados e passageiros. Vale lembrar que, até hoje, a
paz tem sido o principal capital político do Brasil diante do mundo.
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