quarta-feira, 8 de outubro de 2014

Política e meio ambiente

por Paulo Diniz
(publicado na edição de 05/10/2014 de O Tempo - Belo Horizonte, Minas Gerais)
 
O noticiário recente tem apresentado quadro ambiental desalentador no Brasil: da falta de água nas cidades até o catastrófico esgotamento da nascente do rio São Francisco, as novidades assustam. Começa a ficar claro que a imediata sobrevivência humana depende da priorização das questões ambientais. Dessa forma, o cenário político será afetado, dentro em breve, por uma nova categoria de demandas populares.
Entretanto, a mesma política que sofrerá as consequências da crise ambiental é também responsável por boa parte da degradação que hoje vivenciamos. O uso dos recursos naturais, que gera efeitos sobre toda a população, é tema de discussão e interesse coletivo, portanto, compõe uma dinâmica eminentemente política: decidir que algumas pessoas não podem converter a natureza a seu redor em benefício apenas individual, para com isso viabilizar o bem estar de populações desconhecidas e distantes é, com certeza, algo que demanda discussão coletiva intensa e consenso bem negociado. Dessa forma, o processo de debate político serve para construir decisões legítimas, ou seja, aceitas pela maioria da população; quando tudo isso funciona, o Estado demanda menos força, fiscalização e recursos para concretizar os objetivos coletivos.
A questão ambiental no Brasil, até hoje, tem servido como exemplo negativo do debate coletivo sobre a preservação dos recursos naturais. Motivos de duas ordens contribuem para tal cenário: sociológicos e políticos. Sob a perspectiva sociológica, as obras clássicas que analisam o povo brasileiro são unânimes em apontar a matriz privatista da cultura brasileira: desde o período colonial, as referências principais têm sido a casa e a família. Sendo assim, é pouco familiar ao brasileiro abrir mão de um conforto privado em prol de um benefício público; afinal, a esfera pública é categoria que, para nós, guarda pouco significado. Consequentemente, acaba cabendo ao Estado, mais do que em outros países, fazer uso de sua força para preservar o meio ambiente, coibindo indivíduos de explorar a natureza ao máximo nos limites de sua propriedade privada.
Por sua vez, no campo dos fatores políticos, o Estado tem seu poder erodido pela dinâmica eleitoral: poucos governantes estão dispostos a tomar medidas impopulares contra os interesses individuais de seus eleitores, e assim arriscar perder votos no próximo pleito, principalmente quando o benefício a ser produzido é público, e portanto pouco percebido pela população. Conhecida no campo da Ciência Política como “dilema do político”, essa dinâmica faz com que, por exemplo, prefeitos deixem de implementar corretamente a legislação de uso e ocupação do solo urbano, resistindo em impedir empreendimentos e ocupações irregulares em áreas de preservação.
As críticas ao discurso ambientalista de Marina Silva, apontado por muitos como inimigo do desenvolvimento, estão com os dias contados: dentro em breve, será valorizado o governo que providenciar água a seus cidadãos, e não mais autossuficiência em petróleo.

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