por Paulo Diniz
(publicado na edição de 21/09/2014 de O Tempo - Belo Horizonte, Minas Gerais)
Os
ataques mútuos desferidos pelos candidatos à Presidência da República durante
as últimas semanas têm trazido à memória cenas da conturbada campanha de 1989.
O alvo preferencial vem sendo a candidata Marina Silva, certamente devido à
forma surpreendente com que passou a protagonizar a disputa pelo Palácio do
Planalto. Analisar tal dinâmica é essencial para compreender se a cena política
brasileira passa por um momento de grande mudança, como durante a
redemocratização, ou se presenciamos apenas agressões gratuitas.
O
recurso de transformar características pessoais em potenciais falhas de
caráter, que agora é usado para explorar o fato de Marina ter se convertido ao
protestantismo neopentecostal, foi decisivo em disputas anteriores: candidato
favorito à prefeitura de São Paulo em 1985, Fernando Henrique Cardoso deve
muito da derrota que obteve à acusação de que seria ateu, feita pelo oponente
Jânio Quadros. Esse dispositivo evoca estereótipos do senso comum, evocando
reações imediatas de antipatia no eleitorado em relação ao candidato acusado. Convém
lembrar que a suposta descrença religiosa de FHC não teve papel significativo em
sua vitoriosa campanha presidencial de 1994, já que o tempo permitiu ao
eleitorado uma reflexão mais profunda.
Outro
ponto de ataque tem sido a reduzida base parlamentar com a qual conta o PSB: a
propaganda petista aponta esse dado como sinal de inviabilidade política de um
eventual governo de Marina Silva. Agindo assim, entretanto, os estrategistas de
Dilma esquecem-se de que só seria possível a Marina implantar medidas de cunho
religioso no Brasil caso contasse com sólida base parlamentar. Assim, a falta
de articulação política do PSB, quando poderia indicar equilíbrio entre os
poderes, é tema sumamente ignorado.
O
fantasma do fanatismo ecológico, evocado pela campanha de Dilma por meio de um
suposto antagonismo entre Marina, o pré-sal e o agronegócio, merece atenção.
Por mais que a alteração do padrão produtivo atual possa gerar turbulências, é
verdade que essas mudanças são urgentes, e a escassez de água nas grandes cidades
do Brasil é prova disso. Longe de representar uma ameaça, a inserção da
temática ambiental na agenda política brasileira constitui uma incorporação
aguardada há décadas, de forma que a propaganda petista transforma em defeito aquilo
que é uma significativa inovação.
O
objetivo dos ataques petistas não é o de ganhar votos, mas principalmente o de criar
no público brasileiro um grau significativo de rejeição à figura da ex-senadora
acreana, que hoje é de cerca de um terço da antipatia geral dedicada a Dilma. Como
sentimento que é, a antipatia não necessita de bases racionais nas quais se
sustentar, de forma que é facultativo o uso de um raciocínio coerente quando se
busca desgastar a imagem alheia. Por sua vez, ao se empenhar em desmentir tais
acusações, Marina Silva acaba por acompanhar a pauta proposta pela equipe de
Dilma, sendo envolvida em um jogo que pode ser mortal para sua trajetória
eleitoral.
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