quarta-feira, 28 de agosto de 2013

Vícios do Estado

por Paulo Diniz
(publicado na edição de 28/08/2013 do Correio do Sul - Varginha, Minas Gerais - na edição de 29/08/2013 do Jornal de Uberaba - Uberaba, Minas Gerais - e na edição de 01/09/2013 de O Tempo - Belo Horizonte, Minas Gerais)


Após proposta do governo, o parlamento do Uruguai vem discutindo e aprovando a liberação do consumo e do comércio da maconha no país. Pesquisas de opinião apontam que 63% da população uruguaia é contrária à medida, de forma que a oposição ao governo, já derrotada na Câmara dos Deputados, tenta agora propor a realização de um plebiscito sobre o assunto. O debate é intenso, envolvendo temas como a experiência dos países que já adotaram medidas semelhantes, os limites das liberdades individuais, a relação entre o consumo de maconha e o crime, além dos efeitos sobre a saúde do usuário, isso sem mencionar o uso político-eleitoral que os partidos fazem de suas posições sobre o tema.
Por interessantes que sejam tais discussões, nenhuma atinge o âmago da questão uruguaia. O principal fator é a burocracia do Estado, que viu na regulamentação da maconha uma oportunidade de expandir ainda mais seu controle sobre a sociedade. Pode parecer simplista tal raciocínio, porém alguns elementos têm significado emblemático: dos 43 artigos do projeto de lei aprovado pelos deputados, apenas 12 versam sobre a maconha, enquanto 26 tratam da criação dos novos órgãos que se responsabilizarão pela execução do novo serviço público. O desenho burocrático é amplo, encabeçado pelo Instituto de Regulação e Controle da Cannabis, um novo órgão que se promete grande: controlará a rede de lojas e farmácias credenciadas para vender a maconha, registrará usuários e fiscalizá o plantio da erva.
A empreitada da burocracia uruguaia é audaciosa: uma vez que o preço da maconha será tabelado pelo Estado, foram realizadas pesquisas de mercado para o estabelecimento do preço oficial da porção para consumo.  Curioso imaginar que traficantes de drogas tenham inspirado a ação do Estado, porém a intenção foi mesmo essa: aproximar os preços, para evitar que permaneça existindo o mercado atual, informal e criminoso, portanto livre de limitações, controles e taxas.
Em entrevista recente, um dos arquitetos dessa nova estrutura burocrática expõe um dos grandes interesses do Estado quando afirma que o comércio da maconha movimenta 30 milhões de dólares anuais no país, uma quantia por demais vultuosa para permanecer à margem do controle do Poder Público. Assim, percebemos que os elementos que motivam tão polêmica empreitada são mesmo o aumento da arrecadação e o controle do Estado sobre a sociedade, e não a defesa das liberdades individuais.
O Brasil, por sua vez, registrou em anos recentes um crescimento vertiginoso de seu aparato burocrático federal: conta hoje com o maior número de ministérios e de servidores comissionados de sua história. Com tais dimensões, a burocracia do Estado brasileiro representa não só grandes custos aos contribuintes, mas também adquire uma forte vontade política própria. É urgente a discussão dos limites da máquina estatal no Brasil, como forma de se evitar que, em um futuro próximo, tenhamos de lidar com os vícios de uma burocracia tão voraz quanto a de nossos irmãos uruguaios.

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